Liderar uma transformação da experiência do cliente pode gerar muita ansiedade. Muitos líderes hesitam até em começar porque estão sobrecarregados pelos muitos desafios de implementar mudanças em quase todos os silos da organização. Mas essa hesitação cria riscos reais para o negócio. As recentes mudanças nos comportamentos e nas expectativas do consumidor geradas pela COVID-19 estão forçando as empresas a mudarem a forma como elas se conectam com seus clientes e os atendem. Aquelas que não se ajustarem ao novo normal rapidamente ficarão para trás. A história mostra claramente o valor de investir na experiência do cliente durante uma crise. Na última recessão econômica, as empresas que priorizaram essa experiência geraram três vezes mais retorno aos acionistas se comparadas com as empresas que não priorizaram. A hora de agir é agora.
A boa notícia é que agora existe uma fórmula comprovada para realizar transformações na experiência do cliente. Essa fórmula envolve passos específicos em três componentes principais: uma aspiração claramente definida, uma abordagem de transformação ágil e uma implementação cuidadosa de novas capacidades, principalmente de advanced analytics (Quadro). Ao combinar esses três componentes, as empresas podem conquistar uma vantagem competitiva em sua indústria. Ao longo de 10 anos ajudando mais de 900 empresas a desenhar e executar programas amplos de experiência do cliente, vimos essa abordagem gerar resultados expressivos. Aumentos de 15 a 20% nas taxas de conversão de vendas, quedas de 20 a 50% nos custos de atendimento e melhorias de 10 a 20% na satisfação dos clientes.
Construir aspiração e propósito
O primeiro passo de uma transformação bem-sucedida da experiência do cliente é alinhar uma definição clara do tipo de experiência que se quer oferecer. Quando as empresas definem sua aspiração de experiência do cliente, costumam cair em uma ou em duas das armadilhas: ou a aspiração é genérica e não se alinha bem com o propósito da empresa ou não fica claro como ela criará valor que possa ser medido e monitorado. Cair em uma dessas armadilhas leva a programas de transformação da experiência do cliente sem clareza e coerência.
Uma boa aspiração de experiência do cliente colabora com o propósito e com a promessa de marca da empresa. Alinhadas com suas missões, a Nike busca oferecer experiências inspiradoras, a Starbucks busca oferecer experiências que estimulam e a BMW busca oferecer a experiência mais motivadora. A Costco não tenta replicar a experiência que seus clientes têm em varejistas de alto padrão, mas sim proporcionar uma experiência simplificada nas lojas, que reflita a sua promessa de marca de baixo custo.
As empresas então traduzem as aspirações em valor esperado do negócio, definindo as mudanças específicas no comportamento do cliente que elas projetam. Se um banco estivesse buscando aprofundar o relacionamento com os clientes, por exemplo, esse foco poderia se refletir em uma decisão para medir o sucesso pelo número de clientes que escolheram o banco para todas as suas principais necessidades bancárias. Esse foco no comportamento do cliente muda completamente a discussão entre os líderes das empresas. Eles começam a falar sobre clientes e não sobre finanças. A prioridade passa a ser as experiências que levarão ao comportamento que se espera do cliente, mesmo com a evolução de suas necessidades ao longo do tempo.
Muitas das maiores empresas usam pesquisa quantitativa e análise estatística para fundamentar suas decisões em fatos sobre o que os clientes valorizam, podendo assim priorizar as experiências que mais importam. As empresas mais avançadas usam advanced analytics para fazer simulações do impacto esperado de seus potenciais investimentos, de modo que possam elaborar casos de negócio convincentes para esses investimentos.
Depois de priorizar as experiências com maior impacto potencial sobre o comportamento do cliente, os líderes de experiência do cliente identificam as capacidades tecnológicas e os processos internos que eles precisam para reimaginá-los substancialmente. Esses líderes consolidam as experiências priorizadas e o desenvolvimento das capacidades necessárias para criar um roadmap que identifique atividades críticas trimestralmente. Essas empresas normalmente planejam seus investimentos em incrementos de 24 meses com stage gates frequentes para confirmar que o impacto financeiro esperado foi alcançado.
Transformar o negócio
Embora os executivos normalmente consigam desenvolver roadmaps abrangentes de transformação da experiência do cliente, muitos caem na armadilha de implementar programas convencionais para realizar a mudança necessária. O erro mais comum é dividir vários elementos do programa em diferentes funções. Esse erro gera dificuldades de comunicação e de responsabilidade que comprometem até mesmo as aspirações de transformação mais objetivas.
As iniciativas de experiência do cliente nas empresas que conseguem executá-las com maior sucesso têm um aspecto totalmente diferente. Essas empresas criam equipes ágeis e multifuncionais que têm real responsabilidade por seus projetos, expertise tecnológica aprofundada e uma cultura de design thinking e melhoria contínua. Antes da pandemia, essas equipes podiam ser vistas fazendo resolução de problemas nos quadros dos escritórios, com paredes de vidro, música de fundo e um ritmo contínuo de trabalho. Um banco inovador adotou uma “cultura de sapatos vermelhos” para ilustrar sua velocidade e agilidade de inovação e o CEO trocava seus sapatos por tênis vermelhos ao visitar os design labs. No ambiente atual, essas equipes migraram ininterruptamente para plataformas de colaboração para gerar inovação multifuncional contínua. Para empresas verdadeiramente comprometidas com uma cultura de experiência do cliente, essas plataformas não são ornamentações superficiais. Elas refletem um investimento significativo no recrutamento e no fortalecimento de equipes ágeis com profunda expertise no desenho de experiências, desenvolvimento de plataformas e de tecnologia omnicanal inovadoras e reimaginação de experiências, produtos e serviços para cumprir a promessa de marca da melhor forma.
Para definir personas de clientes e entender suas necessidades, equipes ágeis multifuncionais utilizam design thinking e advanced analytics para realizar pesquisa quantitativa e etnográfica rápida. As equipes realizam workshops de cocriação para desenvolver conceitos inovadores e protótipos que abordam pontos sensíveis. Elas usam advanced analytics para identificar e priorizar métricas de performance significativas, como tempo de espera reduzido, quantificando o impacto financeiro real das mudanças no comportamento do cliente – talvez refletido no aumento de renovações de contratos – e acompanhando o progresso. Após desenvolverem novos produtos e serviços, essas equipes ágeis asseguram que esses produtos e serviços são escalonados por todo o negócio, integrados na plataforma de tecnologia e continuamente testados e refinados nos diferentes segmentos e regiões.
Essas ações de desenho não são itens acessórios. Em nossa pesquisa de 2018 sobre o valor de negócio do desenho, identificamos que as empresas de alta performance centradas no usuário superam seus pares em receita em quase duas vezes. Elas também iteram rapidamente à medida que desenham novas experiências, garantindo que criam um protótipo e testam essas experiências com consumidores para aumentar suas chances de sucesso.
Outro elemento crítico de todos os programas de transformação bem-sucedida da experiência do cliente é uma equipe central que combina ferramentas e métodos de geração de ideias, realiza continuamente pesquisa produtiva e avaliativa de clientes e reúne especialistas multifuncionais com expertise específica, como scrum masters, arquitetos de tecnologia omnicanal, designers e pesquisadores. Essa equipe central garante que a cultura de inovação tecnológica se torna um ativo de vantagem competitiva sustentável ao longo do tempo e em todas as regiões.
Viabilizar a transformação
Os líderes que conseguiram implementar novas experiências para seus clientes sustentam as mudanças desenvolvendo novas capacidades. Identificamos quatro delas como as mais decisivas para o sucesso.
Mentalidades centradas no cliente
Da alta liderança até as linhas de frente, os funcionários precisam se sentir seguros de que têm as habilidades e ferramentas necessárias para oferecer a melhor experiência possível para os clientes. As empresas líderes desenvolvem academias que combinam cursos digitais, workshops ao vivo e incentivos contínuos para apoiar o desenvolvimento de novas capacidades. Cada jornada de aprendizado é customizada para um papel específico na organização. Por exemplo, os funcionários da linha de frente recebem dicas práticas sobre como se colocar no lugar dos clientes e demonstrar empatia ao se relacionar com eles. Os gerentes de experiência do cliente e as equipes de inovação constroem habilidades de acordo com o redesenho da experiência do cliente e a mobilização de equipes multifuncionais. Os executivos recebem dicas sobre como apoiar, acelerar e celebrar a centralidade no cliente dentro da organização – por exemplo, integrando design thinking nas etapas iniciais do processo de planejamento estratégico.
Stack de tecnologia integrado
Para oferecer experiências de cliente omnicanal excepcionais, as empresas precisam de um stack de tecnologia que alcance todo o negócio. Esse stack costuma assumir a forma de uma plataforma digital construída a partir de microsserviços e APIs para oferecer uma variedade de serviços de forma rápida e flexível aos clientes, uma plataforma de contact center omnicanal com reconhecimento de chamadas, chat, vídeo chat e gerenciamento de emails, e um único sistema que integra as plataformas. Por exemplo, uma seguradora de saúde que desejava redesenhar sua jornada de integração de clientes seguia duas frentes de trabalho paralelas: uma que reimaginava e simplificava todo o processo de registro e outra que reconstruía a tecnologia envolvida. As duas equipes, trabalhando juntas, conseguiram modernizar a plataforma e a tecnologia omnicanal, permitindo que elas transformassem o que era um conjunto de processos divergentes, burocráticos e específicos de alguns canais em uma experiência ominicanal digital e integrada. Em apenas seis meses, a empresa triplicou as solicitações online, atingiu 90% de processamento direto e reduziu o trabalho de suporte em 80% e o da linha de frente em 70%.
Modelo operacional e estrutura de governança ágeis
As equipes de inovação apenas são eficazes se têm autonomia para tomar decisões. Isso significa estabelecer processos de tomada de decisão e atribuir direitos formais de decisão para líderes na equipe. Esses novos processos e direitos de decisão normalmente requerem negociações internas, mas geram resultados extraordinários. Por exemplo, uma empresa de serviços financeiros B2B que adotou um novo modelo operacional ágil aumentou sua pontuação de satisfação do cliente de menos de 20 para mais de 50 em dois anos através do aumento das respostas em tempo satisfatório às solicitações dos clientes em 90%, reduzindo o backlog de solicitações em 40% e eliminando a necessidade de 600 horas mensais de funcionários.
Sistema de gestão de performance baseado em analytics preditivos e machine learning
Organizações líderes estão utilizando analytics preditivos, machine learning e big data para superar as limitações conhecidas de feedback dos clientes, que normalmente oferecem uma visão incompleta e imprecisa das reais experiências do cliente. As empresas precisam, no mínimo, de sistemas de gestão com ciclos de feedback sofisticados que ensinem aos funcionários quais comportamentos produzem os melhores resultados e orientem as equipes de inovação sobre onde focar seus esforços. As melhores ferramentas permitem às empresas prever com precisão a atual satisfação e os gastos futuros de cada cliente com base em suas experiências. Uma grande empresa de viagens desenvolveu a capacidade de atribuir pontos para a experiência de cada cliente com base em dados como localização, histórico de programa de fidelidade e experiências em viagens recentes. A empresa então usou machine learning para prever a satisfação de cada cliente com base na experiência individual. Com essa nova capacidade, a empresa melhorou sensivelmente seu contato com os clientes imediatamente após experiências negativas, aumentando a satisfação dos mais insatisfeitos em 800% e reduzindo a perda de clientes em 59%.
Juntando todas as peças
O maior impacto sustentável na experiência do cliente resulta da reunião de três componentes. Um exemplo é como uma empresa energia da Europa atingiu esse impacto. Enfrentando crescentes expectativas dos clientes, dinâmica competitiva agressiva, crescentes pressões regulatórias e de mercado e complexidade interna, sua equipe de liderança respondeu com uma abrangente transformação da experiência do cliente. A transformação incluiu a reformulação da abordagem de go-to-market e do modelo operacional para recuperar uma posição de liderança sustentável em seu mercado.
Para definir as aspirações e o valor que a empresa pretendia extrair da transformação da experiência do cliente, a equipe formulou rapidamente objetivos claros para o negócio. Ao quantificar e priorizar “conjuntos de valores” de experiências de clientes individuais em seus negócios B2C – aquisição, serviço, retenção e digitalização de processos – a empresa desenvolveu um roadmap de transformação para obter melhorias de dois dígitos no EBIT ao longo de três anos.
Para o segundo componente – transformar o negócio – a equipe de liderança formou uma equipe multifuncional composta por “embaixadores” da experiência do cliente de 10 países e uma equipe principal de designers e especialistas em experiência do cliente. Eles se reuniam duas vezes por semana em um local central e trabalhavam como uma “fábrica de experiência do cliente” para consolidar insights, harmonizar definições de jornadas de clientes e traduzir conjuntos de valores e pontos sensíveis de clientes em planos e protótipos tangíveis para jornadas ideais. Sua análise mostrou que a maioria das alavancas de experiência de cliente de alto impacto eram aplicáveis em todos os países apesar das diferenças em mercados individuais. A equipe da fábrica de experiência do cliente criou um microsite funcional para empresas de mudança, colocou no ar no primeiro país piloto em quatro semanas e expandiu para outros países com base em seu impacto financeiro demonstrado: aumento da retenção de clientes e redução nos custos de atendimento, já que menos clientes ligaram pedindo apoio durante sua mudança.
Essas mudanças somente foram possíveis com a transformação das capacidades subjacentes e o estabelecimento de capacitadores críticos – o terceiro componente. A organização adotou princípios ágeis não apenas na fábrica de experiência do cliente, mas também em cada unidade de negócio geográfica – iterando rapidamente e gerando ideias, construindo protótipos e adaptando MVPs com base no feedback do cliente. Para escalonar essas capacidades, a organização realizou sessões de treinamento virtual nas principais habilidades, como metodologia ágil, design thinking e resolução de problemas. A organização codificou melhores práticas em uma biblioteca virtual para ser usada por qualquer membro da equipe em qualquer país. Por fim, demonstrou o alto impacto dessa nova forma de trabalhar por meio de vídeos, comunicados e ferramentas compartilhados em toda a organização.
As jornadas redesenhadas reduziram os custos de contatos pessoais do provedor de energia em mais de 20% e a perda de clientes em quase 15%, e aumentaram significativamente a satisfação dos clientes e funcionários. Como resultado, um terço de todo o impacto potencial do programa de três anos foi atingido nos primeiros 12 meses.
Como começar
As empresas que aspiram se tornar mais centradas no cliente podem usar um dos seguintes métodos de início rápido.
Definir uma aspiração ousada que reflita a promessa da marca
Uma série de três a quatro workshops com executivos normalmente é o que basta para alinhar-se a uma aspiração de centralidade no cliente e a métricas de performance financeira associadas. Muitas empresas conseguem analisar benchmarks externos para definir uma meta e estabelecer um cronograma para atingi-la.
Criar ímpeto com uma equipe de inovação “farol”
Muitas empresas escolhem dar aos clientes e funcionários uma ideia do sucesso implementando um ou mais projetos “farol” que mostram resultados concretos com investimento mínimo. Jornadas redesenhadas normalmente podem ser priorizadas, desenhadas e inseridas em protótipos em 6 a 12 semanas e gerar motivação e apoio para investimentos posteriores. O primeiro farol pode então rapidamente ser expandido para diversas experiências até que se torne o modelo padrão.
Construir um mecanismo integrado de ação e insights de clientes
As empresas mais inovadoras criaram data lakes integrados e usaram advanced analytics e machine learning para melhorar as experiências de cada cliente. Um mecanismo de analytics que permite à liderança identificar intervenções de clientes e estratégias de investimento com o maior impacto pode ser implementado em três a quatro meses.
A experiência do cliente é uma vantagem competitiva no novo normal. Apenas ao adotar os três componentes de uma transformação da experiência do cliente as empresas podem esperar sair da crise com uma vantagem sustentável sobre seus concorrentes.