O papel desempenhado por ferramentas e técnicas de inteligência artificial (IA) nos negócios e na economia global tornou-se o assunto do momento. E isso não é nenhuma surpresa, dado que a IA pode levar a mudanças radicais – provavelmente em uma dimensão nunca vista antes – na forma das pessoas viverem e trabalharem. A revolução da inteligência artificial já ultrapassou seus estágios iniciais, mas a maior parte do seu impacto econômico ainda está por vir.
Uma nova pesquisa realizada pelo McKinsey Global Institute tentou simular o impacto da inteligência artificial na economia mundial. Em primeiro lugar, a pesquisa parte do entendimento do comportamento de empresas e da dinâmica de diferentes setores para desenvolver uma visão de baixo para cima sobre como adotar e absorver tecnologias de IA. Em segundo lugar, ela considera as disrupções mais prováveis que países, empresas e trabalhadores poderão vivenciar em sua transição para a inteligência artificial. É muito provável que existam custos durante o período de transição que deverão ser considerados em todas as estimativas. A análise examina como ganhos e perdas econômicas possivelmente serão distribuídos entre organizações, funcionários e países e como tal distribuição pode prejudicar a captura dos benefícios gerados pelo uso de IA. Em terceiro lugar, a pesquisa examina as dinâmicas de IA para uma ampla gama de países – agrupados com base em características similares – com o objetivo de trazer uma visão mais global da questão.
Esta análise deve ser vista como um guia do impacto econômico em potencial da IA tomando por base os conhecimentos mais avançados disponíveis no momento. Dentre as principais conclusões do estudo, destacamos:
- É grande o potencial de contribuição da inteligência artificial para a atividade econômica mundial
- Um dos principais desafios é que a adoção de intelig6encia artificial pode ampliar o fosso existente entre países, empresas e trabalhadores
É grande o potencial de contribuição da inteligência artificial para a atividade econômica mundial
O McKinsey Global Institute analisou cinco grandes categorias de inteligência artificial: visão computacional, linguagem natural, assistentes virtuais, automação de processos robóticos e aprendizado de máquina avançado. As empresas provavelmente utilizarão essas ferramentas em diferentes níveis. Algumas adotarão uma abordagem oportunista, testando somente uma tecnologia e realizando um piloto colocando-a em uma função específica (uma abordagem que nosso modelo chama de adoção). Já outras empresas podem ser mais ousadas, adotando todas as cinco categorias e absorvendo-as por toda a organização (uma abordagem que chamamos de absorção completa). Existem muitas firmas em diferentes estágios de adoção, que se posicionam entre os dois extremos – e nosso modelo também captura esse impacto parcial.
Até 2030, a média das simulações mostra que cerca de 70% das empresas podem ter adotado ao menos um tipo de tecnologia de IA, mas que menos da metade terá absorvido por completo as cinco categorias. O padrão de adoção e absorção completa pode ser relativamente rápido – similar ao do estágio mais avançado observado com outras tecnologias.
Diferentes barreiras podem interferir na adoção e absorção rápidas (ver vídeo, “Um minuto com o McKinsey Global Institute: desafios da adoção da tecnologia de automação”). Por exemplo, aqueles que adotam as tecnologias mais tardiamente podem ter dificuldade de gerar impacto a partir da inteligência artificial – as empresas que saem na frente já terão capturado as oportunidades existentes, enquanto os retardatários ficam para trás em termos de desenvolvimento de habilidades e atração de talentos.
No entanto, no nível médio global de adoção e absorção mostrado em nossa simulação, a inteligência artificial tem o potencial de produzir atividades econômicas adicionais no mundo de cerca de US$13 trilhões até 2030, ou um PIB cumulativo aproximadamente 16% superior ao atual. Isto significa 1,2% de crescimento adicional do PIB por ano. Se concretizado, este impacto poderá ser comparado favoravelmente ao de outras tecnologias mais genéricas que surgiram no decorrer dos tempos.
Uma série de fatores, incluindo a automação da mão de obra, a inovação e o surgimento de maior competição, afeta o crescimento da produtividade decorrente da inteligência artificial. Micro fatores, tais como o ritmo de adoção de IA, e macro fatores, como a conectividade global ou a estrutura do mercado de trabalho de um país, contribuem na mesma medida para a tamanho do impacto.
Nossa simulação analisou sete possíveis canais de impacto. Os três primeiros estão relacionados ao impacto da adoção de IA na necessidade – e na mescla – de fatores de produção que possuem impacto direto na produtividade de uma empresa. Os outros quatro são externalidades ligadas à adoção de IA relacionadas ao ambiente econômico mais amplo e à transição para IA. Sabemos que esses sete canais não são definitivos ou necessariamente abrangentes o suficiente, mas acreditamos que sirvam de ponto de partida com base em nosso entendimento atual e nas tendências hoje em vigor (Quadro 1).
O impacto da intelig6encia artificial pode não ser linear, mas se acumular em um ritmo acelerado ao longo do tempo. Sua contribuição ao crescimento pode ser duas ou três vezes maior até 2030 do que nos próximos cinco anos. É possível termos um padrão de curva S para a adoção e a absorção de IA – um início lento devido aos custos substanciais e ao investimento associados ao aprendizado e à implementação dessas tecnologias, seguido de uma aceleração motivada pelo efeito cumulativo da concorrência e uma melhoria nas habilidades complementares, acompanhado de inovações nos processos.
Seria um erro de julgamento interpretar esse padrão de impacto de “avanço gradual” como prova de que o efeito da inteligência artificial será limitado. O tamanho dos benefícios para aqueles que adotarem mais cedo essas tecnologias será ampliado nos anos seguintes às custas daquelas empresas com pouca ou nenhuma adoção.
Um dos principais desafios é que a adoção de inteligência artificial pode ampliar o fosso existente entre países, empresas e trabalhadores
Embora a inteligência artificial possa dar um impulso para a atividade econômica, os benefícios provavelmente serão desnivelados.
Como a IA pode afetar os países
A inteligência artificial pode vir a aumentar o fosso entre países, reforçando a atual separação digital existente. Os países podem necessitar de estratégias e respostas diferentes, uma vez que as taxas de adoção da IA variam.
Os líderes em adoção de IA (especialmente em países desenvolvidos) podem aumentar sua vantagem em relação a países em desenvolvimento. Países líderes em IA podem capturar de 20% a 25% adicionais em benefícios econômicos líquidos, em comparação a hoje, enquanto países em desenvolvimento podem capturar somente entre 5% e 15%. Com o arrefecimento do momentum de crescimento do PIB – em muitos casos, parcialmente refletindo o desafio decorrente do envelhecimento populacional – é possível que muitos países desenvolvidos fiquem sem opção e sejam compelidos a incentivar o uso de IA para capturar um maior crescimento da produtividade. Além disso, como nessas economias os índices salariais são altos, o incentivo para substituir a mão de obra por máquinas é muito maior do que o existente em países em desenvolvimento, onde os salários são baixos.
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Por outro lado, países em desenvolvimento tendem a ter outras formas de melhorar sua produtividade, incluindo implementar melhores práticas e reestruturar suas indústrias. Assim, eles podem ter menos incentivos para implantar inteligência artificial (que, de qualquer forma, pode oferecer a eles um benefício econômico relativamente menor do que o gerado em economias avançadas). Alguns países em desenvolvimento podem provar serem exceções à regra. Por exemplo, a China possui uma estratégia nacional em vigor para se tornar um líder global em cadeia de fornecimento de IA e vem investindo pesadamente para tal.
Como a IA pode afetar as empresas
É possível que as tecnologias de IA possam acabar causando um fosso de desempenho entre aquelas que saírem na frente (empresas que absorverem por completo as ferramentas de IA por toda a sua organização nos próximos 5 a 7 anos) e as que ficarem para trás (empresas que não adotarem tecnologias de IA em nível nenhum ou que não tenham absorvido tais tecnologias por completo em suas organizações até 2030).
Em um dos extremos do espectro, as empresas que saírem na frente possivelmente se beneficiarão desproporcionalmente. Até 2030, elas têm o potencial de dobrar seu fluxo de caixa (vantagens econômicas capturadas menos investimentos associados e custos de transição). Isso implica um crescimento líquido anual no fluxo de caixa de cerca de 6% por um período mais longo do que a próxima década. Aquelas que saem na frente tendem a ter uma base inicial de TI forte, maior propensão a investir em IA e visões positivas do caso de negócios para IA.
No outro extremo do espectro, aquelas que não adotarem as tecnologias podem vir a experimentar uma redução de aproximadamente 20% no seu fluxo de caixa em comparação aos níveis atuais, assumindo o mesmo modelo de custos e receita atual. Uma alavanca importante dessa pressão por lucratividade é a existência de fortes dinâmicas competitivas entre organizações, que podem transferir participação de mercado das empresas mais atrasadas para as mais avançadas e levar a um debate sobre a distribuição desigual dos benefícios decorrentes da inteligência artificial (Quadro 2).
Como a IA pode afetar os trabalhadores
Um fosso mais amplo pode vir a ocorrer com os trabalhadores individualmente (ver o vídeo “Um minuto com o McKinsey Global Institute: o que a IA pode e (ainda) não pode fazer”). A demanda por emprego pode incluir menos tarefas repetitivas e se voltar àqueles mais capazes do ponto de vista social e cognitivo, passando a exigir mais habilidades digitais. Perfis de emprego caracterizados por atividades repetitivas ou que exijam um baixo nível de habilidades digitais podem sofrer a maior redução enquanto percentual do emprego total – saindo de cerca de 40% para algo em torno de 30% até 2030. O maior ganho percentual poderá ser em atividades não repetitivas e naquelas que exigem alto nível de capacitação digital, que devem subir de aproximadamente 40% para mais de 50%.
Observações do horizonte da inteligência artificial: modelando o impacto de IA na economia mundial
Essas mudanças terão impacto nos salários. Segundo nossa simulação, cerca de 13% da conta total de salários pode ir para categorias que exijam grandes habilidades digitais e não repetitivas, nas quais a renda pode vir a subir, enquanto que aqueles trabalhadores em categorias repetitivas e de baixa capacitação digital podem ver sua remuneração ficar estagnada ou mesmo ser reduzida. O percentual da conta total de salários desse último grupo pode passar de 33% para 20%.
Houve muitos avanços impressionantes em inteligência artificial nos últimos tempos, mas ainda há desafios substanciais a serem enfrentados. Michael Chui, sócio do MGI, discorre sobre cinco limitações que a IA precisa conseguir superar.
Uma consequência direta desse fosso mais amplo em termos de emprego e salário será a intensificação da “guerra” por talentos, especialmente por aquelas pessoas capazes de desenvolver e utilizar ferramentas de IA. Por outro lado, também há a possibilidade de termos um excedente estrutural de fornecimento de tecnologia para uma parcela ainda muito grande de pessoas que não possuem as habilidades digitais e cognitivas necessárias para trabalhar com máquinas.
No geral, a adoção e a absorção de inteligência artificial pode não ter um impacto significativo no volume líquido de empregos. É bem provável que haja uma pressão substancial na demanda por emprego em tempo integral, mas o impacto líquido total em termos agregados pode ser mais limitado do que muitos temem. Nosso cenário médio global sugere que a demanda total por emprego equivalente a tempo integral pode permanecer inalterada, ou mesmo ter um impacto líquido ligeiramente negativo no emprego até 2030.
A oportunidade relacionada à inteligência artificial é significativa, mas não há dúvida que sua penetração pode causar disrupção. O dividendo de produtividade de IA provavelmente não se materializará de forma imediata. Seu impacto deverá crescer em um ritmo acelerado ao longo do tempo; assim, os benefícios de um investimento inicial podem não ser visíveis no curto prazo. Nesse sentido, será necessário ter paciência e pensamento estratégico de longo prazo.
Os legisladores deverão demonstrar liderança e ousadia para conseguir superar o compreensível desconforto dos cidadãos, que podem perceber a disseminação do uso de automação como uma ameaça a seus empregos. As empresas também se tornarão atores importantes na busca por soluções para a imensa tarefa de treinar e requalificar as pessoas para que possam trabalhar com IA. Os indivíduos terão de se ajustar a um novo mundo em que a rotatividade no emprego pode se tornar mais frequente, poderá haver a necessidade de fazer uma transição para novos tipos de emprego, e provavelmente será necessário atualizar e modernizar continuamente suas habilidades para se adequarem às necessidades de um mercado de trabalho dinâmico e em constante transformação.
Com o uso de tendências históricas referentes a novos empregos criados para trabalhos antigos e o ajuste para uma proporção menor entre mão de obra e produção – que considera a natureza das tecnologias de IA de economizar mão de obra em decorrência da automação inteligente – as novas posições geradas pelo investimento em IA podem efetivamente aumentar o volume de empregos em cerca de 5% até 2030. O efeito total da produtividade pode ter uma contribuição positiva para o emprego de aproximadamente 10%.