Os centros de capacidades globais (GCCs, na sigla em inglês de “global capability centers”)1 estão enfrentando um desafio preocupante e de longa duração: como evitar a saída de bons talentos. Em nossas conversas com GCCs, os executivos relatam que os índices de rotatividade de pessoal são altos. A combinação das saídas com a atual volatilidade do mercado de talentos vem causando disrupção e desestabilização na cultura das empresas, aumentando os custos do recrutamento e resultando na perda de conhecimento institucional, em tempo adicional gasto no treinamento de novos funcionários e na redução da produtividade e da qualidade do trabalho.
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Embora algumas das pressões pela retenção de profissionais estejam diminuindo no clima econômico atual, os problemas subjacentes persistem. As empresas com visão de futuro têm agora uma oportunidade de ouro de enfrentá-los.
Em sua maioria, os líderes sabem da importância de solucionar o problema da retenção. A questão é que eles costumam ter uma compreensão limitada do que seus funcionários valorizam de fato. E, muitas vezes, optam por soluções instantâneas, em vez de enfrentar os problemas subjacentes. Essa abordagem leva à dependência de um conjunto de ferramentas ineficientes, como aumentar a remuneração e os benefícios ou oferecer a flexibilidade básica de trabalhar em casa, o que, como seria de prever, gera pouca mudança nos índices de retenção.
Há abordagens melhores. Nossa pesquisa deixou claro que a melhor maneira de resolver o problema é melhorar a experiência do funcionário (EX, na sigla em inglês de “employee experience”),2 o que reforça a fidelidade dos funcionários e, como consequência, sua resiliência e continuidade.3 Os executivos devem tratar a EX tão seriamente quanto tratam a experiência do cliente (CX, na sigla em inglês de “customer experience), usando, para tanto, uma abordagem mais científica e mais personalizada.
Nossas pesquisas e análises revelam que, embora a remuneração e os benefícios sejam importantes, eles se tornaram, em essência, requisitos básicos. Os melhores talentos estão em busca de benefícios adicionais, como uma cultura positiva e de apoio, além de flexibilidade para permanecer na organização atual ou procurar um novo emprego. Ao executarem cinco ações focadas, as empresas podem não apenas manter seu pessoal, como também ajudá-lo a ser mais produtivo.
Cinco ações para melhorar a EX
Para entender o que os funcionários querem de sua organização, pesquisamos as práticas de EX de organizações do mundo todo.4 Esses insights destacaram cinco ações que os executivos podem realizar para criar um ambiente de trabalho que dê um melhor apoio aos funcionários.
1. Usar personas e jornadas para personalizar a EX
Nossa análise definiu nove jornadas principais do funcionário e descobriu que seis delas têm uma influência enorme sobre o ingresso e a permanência dos funcionários em uma organização (Quadro 1). Quatro dessas jornadas – a de mudança de função, a de feedback e coaching, a de avaliação do desempenho e a de treinamento e desenvolvimento de competências – podem ter um efeito particularmente prejudicial quando mal executadas. Por exemplo, nossa pesquisa constatou que a satisfação dos funcionários com essas quatro “jornadas falhas” cai com o tempo de serviço, sendo que as mulheres apresentam a queda mais acentuada.
Uma abordagem padronizada da EX não é adequada. O que as empresas devem fazer é criar personas de funcionários e depois desenvolver soluções sob medida nas dimensões selecionadas para garantir que as ofertas estejam acertando o alvo. Por exemplo, quando o GCC de um banco global identificou o “apoio em eventos importantes da vida” como uma jornada que importava para a maioria dos funcionários, ele reformulou suas políticas e programas de benefícios de modo a incluir o reembolso do valor gasto na montagem do escritório em casa, além de apoio ao bem-estar.
2. Reformular a função do gerente de modo a valorizar o coaching e a mentoria
Quando os funcionários iam ao escritório regularmente, os gerentes costumavam passar a maior parte do tempo monitorando o desempenho deles e executando tarefas administrativas. A título de exemplo, no GCC de uma seguradora global, um gerente passava 20% de seu tempo gerindo questões relacionadas a transporte e assiduidade. Na era do trabalho híbrido, os gerentes precisam estar preparados para dar coaching e feedback individualizados aos funcionários – tanto presencial quanto virtualmente.
Esse insight se refletiu em nossa análise, que constatou que, quando um gerente demonstra atenção aos profissionais, a EX melhora. Embora esse resultado talvez não seja surpreendente, as empresas costumam subestimar seu impacto e ser incapazes de definir o que querem que seus gerentes façam. Elas precisam remodelar a função em seus fundamentos (Quadro 2).5
Para atender às necessidades dos funcionários, as quais vêm mudando, os gerentes devem estar preparados para desempenhar quatro funções principais:
Solucionador de problemas. Dar apoio em atividades operacionais e administrativas de alta complexidade (por exemplo, auxiliar em processos internos e levar problemas de clientes aos superiores).
Coach. Oferecer orientação para ajudar os funcionários a desenvolver capacidades e expertise em sua área.
Conselheiro. Entender as aspirações de carreira dos funcionários, dar atenção ao bem-estar físico e mental deles e atuar como conselheiro de confiança.
Embaixador cultural. Promover a conectividade dos funcionários em um ambiente de trabalho híbrido e atuar como modelo com relação aos comportamentos e valores desejados (por exemplo, sendo acessível para os funcionários e realizando uma comunicação proativa).
Essa mudança exigirá que as empresas invistam em treinamento adicional e criem novos incentivos. Programas de treinamento podem ajudar os gerentes a se concentrar no desenvolvimento de novas competências essenciais (como coaching remoto, mentoria, fomento dos relacionamentos interpessoais, desenvolvimento da confiança, ajuda na gestão do estresse e promoção do bem-estar) e no uso de novas tecnologias. Oferecer mentores de diferentes departamentos e dar aos gerentes um tempo específico para desenvolver essas habilidades pode ajudá-los a dominar suas novas funções.
3. Encontrar novas maneiras de incorporar uma cultura e valores voltados a um ambiente de trabalho híbrido
Uma cultura positiva e de apoio, caracterizada pela inclusão e o respeito, está fortemente associada ao bem-estar geral e à experiência dos funcionários (Quadro 3). Muitas vezes, esses atributos podem ter uma influência significativa na conexão de um funcionário com o propósito e a marca da organização. Esse padrão é especialmente válido para as funcionárias: à medida que as mulheres sobem na hierarquia, o bem-estar delas costuma cair bastante, infelizmente.
Devido à falta de interação presencial, as empresas devem conceber novas maneiras de comunicar, promover e viver sua cultura e seus valores.6 Entre as abordagens úteis estão programas de recompensa, atividades virtuais de consolidação de equipes (“team building”) e um manual que descreva a missão, a visão e a cultura da organização. As empresas também terão de investir em capacidades tecnológicas para encontrar novas formas de obter um bom envolvimento dos funcionários remotos. No GCC de um banco global, a liderança sênior tornou-se um modelo de conduta cultural e, além disso, formou “defensores e embaixadores culturais” para ajudar a promover as melhores práticas em novas maneiras de trabalhar.
4. Remodelar o escritório com vistas à colaboração e à conexão
Os funcionários estão buscando flexibilidade com relação a seu local de trabalho. Nossa pesquisa constatou que mais de 90% deles preferem um modelo híbrido, com uma média de um dia e meio por semana no escritório. Três quartos dos funcionários relatam que trabalhar em casa é um fator muito importante para permanecerem em sua organização atual. Mais de 70% dos funcionários querem que o tempo de deslocamento entre casa e trabalho seja inferior a 30 minutos (Quadro 4). Portanto, é crucial que as empresas concebam e implementem um modelo de trabalho híbrido adequado.7
Os profissionais veem cada vez mais o escritório como um espaço de colaboração e conexão. Essa visão dá uma ideia do escritório do futuro: escritórios menores com espaços de trabalho flexíveis e pelo menos 50% da área destinada a usos múltiplos. Para incentivar as pessoas a ir ao escritório, as empresas também devem explorar a possibilidade de ter escritórios satélites em locais selecionados perto dos funcionários para reuniões menores, sendo o escritório principal usado para desenvolvimento e colaboração, além da realização de atividades sociais.
No GCC de um banco global, os líderes fizeram uma remodelação radical de seu escritório. Até agora, essa nova abordagem reduziu em mais da metade a área alocada para a realização do trabalho tradicional, ao mesmo tempo em que adicionou áreas comuns para atividades como treinamento, coaching, jogos e eventos. Esse escritório adequado à finalidade não só atende melhor às novas necessidades dos funcionários, como também deve reduzir a área total em 40%.
5. Repensar o expediente de trabalho tradicional
O equilíbrio entre a vida profissional e a pessoal passou a ser prioridade durante a pandemia, sobretudo para os funcionários da geração Z e os pais que trabalham. A flexibilidade para cuidar das obrigações pessoais e familiares e ainda trabalhar um dia inteiro atrai uma ampla gama de profissionais.8
O centro de serviços compartilhados de um banco global reagiu a essa necessidade oferecendo maior flexibilidade quanto aos horários de trabalho (por exemplo, dando aos funcionários a opção de trocar de turno com colegas e de dividir um turno em blocos), de modo a se alinhar às preferências baseadas na persona e aos eventos da vida. Um funcionário fez o seguinte comentário sobre essas mudanças: “Adoro poder passar mais tempo com meus filhos em casa e não preciso prejudicar meu desempenho no trabalho”. Esses ajustes reduziram em 80% a rotatividade mensal de pessoal.
As empresas têm várias opções à sua disposição, inclusive permitir que os profissionais de tecnologia adotem turnos diurnos flexíveis (como dias divididos em blocos ou horários de trabalho flexíveis). Exemplificando, metade dos funcionários estaria aberta a trabalhar mais horas em menos dias (Quadro 5). Um entrevistado da pesquisa observou: “Espero que o esquema de dez [horas por dia] por quatro [dias por semana] seja oferecido para que eu possa passar mais tempo com a família”. Esse sistema requer que as empresas adaptem sua abordagem de contratação e alocação de pessoal de modo a garantir níveis suficientes de cobertura.
Como a EX é fundamentalmente pessoal, as organizações precisam melhorar sua capacidade de ouvir, a fim de garantir que estejam atendendo às prioridades dos funcionários. Ao obter uma melhor compreensão do que os funcionários valorizam e reformular todos os elementos do trabalho – das funções ao escritório, passando pelos horários –, um GCC pode se posicionar como um empregador preferencial por muitos anos.