Crises inesperadas, volatilidade e uma aceleração geral das mudanças estão, cada vez mais, se tornando a norma. Mas poucos aceitam isso como normal; para a maioria, é tudo muito estressante e exaustivo.
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Basta pensarmos em todas as grandes disrupções que hoje ocupam as agendas dos líderes: disseminação generalizada da automação, da inteligência artificial e de outras tecnologias no trabalho; transformações geopolíticas e econômicas globais; os impactos das mudanças climáticas; manipulação genômica e outras inovações científicas e de bioengenharia; movimentos por justiça social; e a incessante evolução da demografia e das expectativas dos trabalhadores.
Nunca houve nada igual.
Para executar com sucesso as estratégias de negócios nesse cenário, os líderes do século 21 precisarão de uma força de trabalho engajada e inovadora, que seja capaz de mudar de rumo de forma rápida, eficaz e fluida. Os funcionários precisarão estar prontos para adquirir novas capacidades, adotar novas normas e reconsiderar ideias e atitudes arcaicas. Os líderes deverão estar dispostos a fazer o mesmo.
No entanto, não é fácil alcançar resiliência e adaptabilidade nos níveis individual e organizacional. Os seres humanos têm uma predileção natural por ordem, previsibilidade e controle, e farão tudo o que for possível para evitar o caos, a incerteza e a volatilidade. Pesquisas mostram que quando o caminho à frente é incerto e as pressões de prazo e desempenho são constantes (ou crescentes), equipes e indivíduos tendem a recorrer ao que já sabem – mesmo que essa abordagem não seja a mais apropriada para a situação.
Embora alguns líderes cheguem até a defender que, às vezes, diante da incerteza, funcionários e equipes devem “simplesmente continuar fazendo” o que já estão fazendo, é porque não conseguem distinguir os momentos que exigem resiliência, aqueles que exigem adaptabilidade ou qual é a interdependência entre ambas. Considere este exemplo do mundo esportivo: Stephen Curry, um dos maiores arremessadores da NBA, certa vez errou um arremesso crucial de três pontos no final do primeiro tempo de uma partida eliminatória decisiva. Apesar da falha, porém, continuou responsável pelos arremessos de três pontos no segundo tempo, pois confiava em uma habilidade que praticara e aprimorara durante décadas. Isso é resiliência. Mas imaginemos que um dia a NBA resolva limitar o número de arremessos de três pontos que um time pode fazer durante partidas eliminatórias. Nesse caso, talvez não valesse mais a pena para Curry “simplesmente continuar arremessando” e ele precisaria repensar suas habilidades e seu estilo de jogo. Isso é adaptabilidade.
Assim como atletas de nível internacional, líderes e organizações precisam ser tanto resilientes como adaptáveis para crescer, inovar e manter a saúde organizacional. Uma pesquisa recente do McKinsey Health Institute (MHI)1 mostra que indivíduos que relatam alto grau de resiliência ou de adaptabilidade também têm melhor saúde holística e são mais engajados que seus colegas.2 Além disso, aqueles que excedem em ambas as dimensões são mais de três vezes mais propensos a relatar alto engajamento no trabalho e quase quatro vezes mais propensos do que seus pares a relatar um aumento de comportamentos inovadores (Quadro 1).3
Para serem resilientes e adaptáveis, líderes e funcionários precisam de um mix variado de habilidades. Resiliência requer, entre outras coisas, a capacidade de ver as transformações como desafios e, simultaneamente, como oportunidades de avançar, ordenar pensamentos e emoções, aprender com experiências passadas e implementar mudanças. Adaptabilidade, por sua vez, exige a capacidade não só de enfrentar incertezas com a mente aberta e disposição para aprender, mas também de pensar de forma flexível e criativa sobre os problemas à medida que forem surgindo. Quando líderes e funcionários possuem ambas essas habilidades, eles são capazes (como Stephen Curry) de discernir melhor em quais ocasiões apenas resiliência é suficiente, quando uma resposta adaptativa é necessária e como integrar ambas em suas estratégias, operações e decisões.
Nossas pesquisas e experiências trabalhando com a alta liderança de organizações em diversos setores e regiões geográficas apontam para quatro ações que os líderes podem empreender para promover resiliência e adaptabilidade em si mesmos e na força de trabalho – o que aumentará a probabilidade de enfrentarem com sucesso até mesmo os períodos mais extremos de volatilidade. Os líderes devem fazer o seguinte:
- Definir um rumo ou estrela-guia para a organização de modo a ajudar as pessoas a avançar em uma direção comum.
- Construir uma comunidade que ofereça segurança psicológica, não uma mera força de trabalho.
- Assegurar que eles próprios sejam resilientes, adaptáveis e possam servir de modelo.
- Incentivar os funcionários a adquirir e desenvolver em grupo essas habilidades.
Neste artigo, exploraremos pesquisas recentes da McKinsey sobre resiliência, adaptabilidade e sua relação com o desempenho dos funcionários. Examinaremos também as quatro ações mencionadas acima e como elas podem ajudar os líderes a cultivar resiliência e adaptabilidade em escala. É fundamental que as organizações encontrem maneiras de transformar disrupção em vantagem competitiva. Como o autor e psicoterapeuta Viktor Frankl observou em seu livro Em busca de sentido, “Quando não é mais possível mudar uma situação, devemos escolher mudar a nós mesmos”.
Resiliência e adaptabilidade em números: sua importância para o bom desempenho da organização
Em um mundo onde disrupções dos negócios não são uma surpresa, mas ocorrem em ondas de imprevisibilidade, mudanças geram e agravam novas mudanças, os líderes das empresas precisam refletir de maneira mais matizada sobre como administrar a si mesmos e a suas organizações. Pesquisas recentes da McKinsey e do MHI podem ajudá-los nesse sentido, pois revelam como a presença (ou ausência) de resiliência e adaptabilidade pode afetar líderes, indivíduos, organizações e o desempenho geral da empresa. Seguem algumas de suas conclusões.
As organizações investem pouco em resiliência e adaptabilidade
Pesquisas recentes da McKinsey apontam para uma escassez de adaptabilidade e resiliência nas organizações. De acordo com a pesquisa Talent Trends, por exemplo, apenas 16% das empresas globais estudadas investem atualmente em programas de adaptabilidade e aprendizado contínuo. No entanto, segundo a mesma pesquisa, 26% dos aproximadamente 10 mil funcionários entrevistados consideram a adaptabilidade uma das competências mais necessárias. Isso é particularmente verdadeiro para os trabalhadores da linha de frente ou com pouco tempo de serviço (um ano ou menos).4
Assim, a maioria das pessoas se sente despreparada para lidar com a incerteza
O MHI realizou uma pesquisa com 30 mil funcionários em todo o mundo para avaliar seus níveis de resiliência e adaptabilidade.5 As perguntas relacionadas à resiliência buscavam avaliar sua confiança e grau de preparo para lidar com eventos inesperados; as perguntas sobre adaptabilidade diziam respeito a uma perspectiva positiva ou até prazer em enfrentar eventos inesperados ou mudanças. Apenas 23% dos entrevistados, em média, responderam afirmativamente quando indagados se eram capazes de lidar com eventos inesperados e, ao mesmo tempo, manter uma atitude otimista diante da imprevisibilidade. Por sua vez, 56%, em média, responderam favoravelmente a perguntas focadas na resiliência e 28%, em média, a perguntas sobre adaptabilidade.
Segurança psicológica é essencial para desenvolver resiliência e adaptabilidade
Pesquisas anteriores da McKinsey mostraram o quanto a segurança psicológica é importante para uma liderança eficaz e o bom desempenho organizacional. Entre outras coisas, ela permite que os membros das equipes expressem ideias ousadas e pontos de vista divergentes, contribuindo significativamente para a colaboração e a inovação. Estudos do MHI revelam que funcionários psicologicamente seguros apresentam níveis de engajamento e comportamento inovador pelo menos duas vezes superiores aos daqueles que trabalham em ambientes que não oferecem tal segurança.6 Nosso estudo mais recente sobre resiliência e adaptabilidade revela que a combinação de resiliência e segurança psicológica eleva o nível de engajamento em 3,6 vezes e o de comportamento inovador em 3,9 vezes; por sua vez, quando se combina adaptabilidade e segurança psicológica, essas elevações são de 2,9 e 3,3 vezes, respectivamente.
Sólido suporte organizacional também é importante
A pesquisa do MHI mostra que quando os funcionários contam com sólido apoio da organização (processos claros, recursos abundantes e suporte dos supervisores ou colegas, por exemplo) juntamente com segurança psicológica, resiliência e adaptabilidade, eles são seis vezes mais propensos a apresentar alto engajamento ou comportamento inovador (Quadro 2).7
Juntando os pontos: cultivando resiliência e adaptabilidade em escala
O que os líderes podem fazer para reunir todos esses elementos e desenvolver (e integrar) resiliência e adaptabilidade em escala? Existem quatro ações que podem ser empreendidas para redefinir as condições organizacionais, criar certo nível de controle e oferecer aos funcionários as habilidades e a confiança de que necessitam para reagir a disrupções onde e quando surgirem.
Definir um rumo ou estrela-guia para a organização
Quanto mais as coisas mudam na organização, mais os indivíduos e as equipes buscarão sinais de estabilidade. A alta liderança pode fomentar a resiliência e a adaptabilidade em escala direcionando todos os funcionários para um mesmo norte ou estrela-guia comum – por exemplo, certos objetivos compartilhados e alguns princípios ou valores fundamentais (propósito, integridade, autenticidade) aos quais os funcionários poderão se apegar em momentos difíceis. Por exemplo, um líder poderá estabelecer que o valor central da empresa é “colocar o cliente em primeiro lugar em tudo o que fazemos”. Essa estrela-guia torna-se então uma fonte de estabilidade no caso de um novo concorrente tumultuar o mercado e as equipes precisarem rapidamente atualizar o desenho de um produto, adquirir novas habilidades ou adotar novas formas de trabalhar – desse modo, independentemente do que mais possa estar acontecendo, continuará claro para todos que ainda é preciso colocar o cliente em primeiro lugar.
Os líderes também devem desenvolver mecanismos claros para medir com precisão o progresso da organização em atingir as metas delineadas por sua estrela-guia, e devem revisar continuamente essas métricas para assegurar que continuam alinhadas com as prioridades estratégicas. Devem ainda compartilhar amplamente esses dados com equipes e indivíduos em toda a organização, pois tais informações podem ser críticas para evitar que se prendam a seus próprios objetivos e alvos isolados, alguns dos quais talvez não sejam mais apropriados em um cenário drasticamente alterado.
Construir uma comunidade que ofereça segurança psicológica, não uma mera força de trabalho
Quando indagadas sobre o melhor aspecto de seu trabalho, a maioria das pessoas mencionará seus colegas – aqueles com quem passam horas e horas construindo, vendendo, resolvendo problemas e realizando milhares de outras tarefas colaborativas que compõem um típico dia de trabalho. Para promover a resiliência e a adaptabilidade em escala, os líderes precisam fortalecer esse senso de comunidade e transformar um “bando de residentes isolados da empresa” em uma vizinhança funcional, flexível e amigável.
Não existe uma fórmula simples para o sucesso, mas dois ingredientes fundamentais são a segurança psicológica e a ênfase no senso de responsabilidade. Curiosamente, muitas organizações procuram promover uma às custas da outra, quando, na verdade, ambas devem ser cultivadas em grau elevado. Conforme mencionado acima, a segurança psicológica permite conversas mais abertas, feedbacks mais sinceros, discussões mais francas e, em última análise, mais confiança e senso de responsabilidade, pois equipes que se sentem à vontade para discutir as causas e consequências de erros ou resultados insatisfatórios são mais propensas a alcançar suas metas.
Em uma grande empresa de viagens, problemas de segurança levaram os líderes a renovar a cultura (incentivando os funcionários a focar tanto a segurança como os resultados comerciais) e a promover a segurança psicológica (recompensando quem identificasse e soasse o alarme diante de alguma falha). Essas mudanças permitiram que a empresa gerenciasse melhor os riscos, obtivesse ideias mais inovadoras das equipes e aumentasse a retenção e o engajamento de funcionários. Nesse novo ambiente, todos sabiam que, quando se manifestassem, seriam ouvidos e levados a sério.
Assegurar que os próprios líderes sejam resilientes, adaptáveis e possam servir de modelo
Este artigo trata de resiliência e adaptabilidade coletivas, mas isso só será possível se todos os líderes da organização – desde a diretoria até os gerentes de nível médio e a linha de frente – aprimorarem suas habilidades individuais de resiliência e adaptabilidade, que incluem autoconsciência, consciência situacional, agilidade cognitiva e de aprendizagem, e flexibilidade e controle emocionais. Os CEOs precisam ser honestos consigo mesmos, principalmente sobre suas próprias experiências com disrupção: Como regularam suas emoções em momentos de crise? Como tomaram decisões em situações de escassez de informações básicas ou quando não tinham todas as respostas? Como John Plant, CEO da Howmet Aerospace, explicou aos autores de The journey of leadership: How CEOs learn to lead from the inside out: “Imaginem que você foi contratado como CEO e gerenciou bem a primeira fase do ciclo, algo que provavelmente exigiu habilidades de reestruturação. No entanto, após três ou quatro anos, a empresa entra numa fase de crescimento e, como você não possui as competências certas para isso, o Conselho acabará por demiti-lo. Pouquíssimas pessoas têm a experiência e a versatilidade para atuar de modos tão diferentes.” Portanto, é essencial que os líderes reservem tempo para refletir, fazer essas perguntas e revê-las com frequência – não apenas para promoverem a adaptabilidade alheia, mas também para continuarem a desenvolver essa habilidade em si mesmos.
Graças a suas perspectivas e experiências únicas, os CEOs podem compartilhar suas experiências de transformação. Devem explicar – em assembleias de funcionários, reuniões com equipes ou conversas individuais – como administraram a volatilidade no passado. Também devem envolver os membros do Conselho em treinamentos de resiliência e adaptabilidade para que essas habilidades, mentalidades e condições sejam incorporadas à organização. Devem ainda integrar em escala a adaptabilidade à estratégia maior da empresa, em pé de igualdade com os demais componentes do plano estratégico. Por fim, devem introduzir aspectos de resiliência e adaptabilidade nos processos de atração e retenção de talentos – contratando com base nessas habilidades, desenvolvendo programas de treinamento em torno delas e promovendo candidatos com alto potencial transformador ou que possuam ou demonstrem interesse por resiliência e adaptabilidade.
No caso dos gerentes de nível médio e funcionários da linha de frente (que normalmente são responsáveis por traduzir a estratégia em execução e supervisionar diretamente os resultados), adaptabilidade e resiliência são habilidades particularmente essenciais. A capacidade de se adaptar, se recuperar e avançar, desenvolver autoconsciência e consciência situacional, regular as emoções e, de variadas maneiras, demonstrar resiliência e adaptabilidade pode ter efeitos diretos (e exponenciais) sobre indivíduos, equipes e organizações.
Incentivar os funcionários a adquirir e desenvolver em grupo as habilidades de resiliência e adaptabilidade
Pesquisas mostram que, tanto em indivíduos como em equipes, o aprendizado social pode acelerar a absorção de novas informações, a rememoração de lições aprendidas e a motivação para agir de modo diferente. O aprendizado social une as capacidades cognitivas e as emocionais. Indivíduos que aprendem como parte de um grupo nunca apenas rememoram o que aprenderam, pois também recordam como os outros reagiram, o que os outros disseram para facilitar o próprio conhecimento e assim por diante. Os líderes devem incentivar as equipes a criar experiências similares de aprendizado e uma linguagem em comum sobre mudança, volatilidade e incerteza – temas que, como mencionamos, os seres humanos tendem instintivamente a evitar. A força do coletivo pode ser um motivador eficaz.
Certa empresa farmacêutica implementou em três fases um programa de treinamento em resiliência e adaptabilidade, atingindo mais de 9 mil funcionários em cada etapa, sinalizando a importância dessas habilidades em todas as áreas. Na primeira fase, a equipe de liderança participou de workshops presenciais facilitados, nos quais as lições foram reforçadas com módulos online, discussões presenciais e colaboração entre os participantes. Na segunda, cerca de 4 mil líderes de pessoas de toda a empresa puderam acessar ferramentas digitais com ritmo de aprendizado personalizável, reforçadas por módulos online e aprendizado social. Na fase final, cada funcionário da organização participou de sessões personalizadas complementadas por um aplicativo online e por aprendizado social.
Todas as fases do treinamento exigiram dos funcionários apenas algumas horas ao longo de três meses (com breves encontros semanais regulares). A adaptabilidade e o bem-estar dos grupos melhoraram perceptivelmente em comparação com um grupo de controle, sendo que os participantes citaram o aspecto de aprendizado social como uma parte importante do programa. Os líderes disponibilizaram tempo e espaço físico para que indivíduos e equipes pudessem explorar sua curiosidade, observar e imitar uns aos outros e praticar conceitos críticos em grupo. Além disso, o aprendizado foi alinhado com a estratégia maior da empresa e com os objetivos da equipe.
Quando a eletricidade foi inventada e substituiu as máquinas a vapor nas fábricas, levou 30 anos até que essa inovação melhorasse a eficiência e a produtividade. Muitas empresas simplesmente não conseguiam se adaptar com suficiente rapidez às novas circunstâncias.
Hoje, líderes empresariais e organizações enfrentam uma dinâmica semelhante. No entanto, desta vez têm que confrontar não apenas uma, mas toda uma série de disrupções técnicas, econômicas, geopolíticas e sociais, todas exigindo aprendizado e adaptação (muito além de uma estrutura organizacional ágil). Para evitar o mesmo destino dos antigos donos de fábricas movidas a vapor, os líderes atuais precisam reconhecer dois fatores críticos associados à mudança – resiliência e adaptabilidade – e a relação de codependência entre eles. É essencial criar condições de trabalho que permitam que indivíduos e equipes se tornem mais resilientes e adaptáveis, integrando essas habilidades às estratégias de negócios. Nem os líderes e, para falar a verdade, nem o mundo podem se dar ao luxo de esperar três décadas para aprender a integrar e se adaptar à próxima grande transformação do universo empresarial.