O capital social – ou seja, a presença de redes, relacionamentos, normas compartilhadas e confiança entre indivíduos, equipes e líderes empresariais – é o fator unificador das organizações. Quando as equipes se sentem conectadas, tendem a fazer mais trabalho e com maior rapidez. Quando os colegas confiam em seus gerentes e uns nos outros, costumam ser mais envolvidos, mais dispostos a ir além dos requisitos mínimos de trabalho, mais propensos a permanecer no emprego e, como mostram as pesquisas, mais propensos a recomendar que outras pessoas ingressem em sua organização.1 O capital social é importante para o desempenho de uma organização.
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Desde o início da pandemia de COVID-19, no entanto, as conexões no local de trabalho estão mais escassas. Recentemente, entrevistamos em torno de 5,5 mil trabalhadores dos EUA sobre a situação de sua rede e de suas conexões internas e externas.2 Mais de três quartos dos entrevistados que desempenham funções “tradicionais”3 – especialmente mulheres e trabalhadores da linha de frente – relatam que estão se conectando com outras pessoas com menos frequência, que sua rede está menor e que vêm dedicando menos tempo e empenho à construção de relacionamentos desde o início da pandemia.
Esse declínio é preocupante, sobretudo em um momento no qual funcionários de todo o mundo continuam saindo do emprego em quantidades inéditas, muitas vezes sem ter outro em vista, apesar da recessão econômica iminente. Por exemplo, na mais recente pesquisa da McKinsey sobre o Grande Desligamento, com uma amostra global que abrangeu cerca de 13 mil trabalhadores de seis países e 16 setores, quase dois em cada cinco funcionários dizem estar cogitando sair do emprego nos próximos três a seis meses.4
Os empregadores, por sua vez, têm de gerir os custos financeiros e de oportunidade associados a esse grau de desligamento – segundo a Gallup, por exemplo, o custo de substituir um funcionário pode variar da metade ao dobro de seu salário anual,5 e as empresas podem sofrer perdas significativas de produtividade e conhecimento.
No panorama pós-pandemia, as indicações, as conexões pessoais e as percepções sobre a inclusividade e a comunidade de uma empresa terão um peso cada vez maior nas decisões das pessoas a respeito de onde procurar trabalho – e se devem permanecer em seu emprego atual.6 É imperativo, portanto, os líderes empresariais gerirem o capital social da mesma forma que gerem o capital financeiro, o humano e outras formas de capital corporativo: de maneira sistemática e deliberada. Eles podem começar por uma avaliação do capital social da empresa em três dimensões7:
- Motivação. Os funcionários estão motivados a construir e manter relacionamentos e estão em um ambiente que incentiva essa construção de relacionamentos?
- Acesso. Os funcionários têm acesso às redes e aos relacionamentos que estão buscando construir?
- Capacidade. Os funcionários têm aquilo de que precisam (como tempo, recursos e habilidades) para construir e manter essas redes e esses relacionamentos?
Com base nessa avaliação, os líderes podem usar várias ferramentas e uma combinação de iniciativas organizacionais e individuais para construir ou fortalecer conexões no local de trabalho. No nível organizacional, por exemplo, os líderes empresariais podem incorporar requisitos de construção de comunidade ou de rede às avaliações de desempenho. No nível individual, podem oferecer aos funcionários coaching e mentoria sobre maneiras de aumentar o envolvimento e as conexões no local de trabalho.
No presente artigo, compartilharemos os resultados de nossas pesquisas sobre a situação do capital social e sugeriremos maneiras pelas quais os líderes empresariais podem ajudar funcionários e equipes a reconstruir, manter e usar o capital social em seu benefício. Prestar mais atenção a essa forma de capital corporativo pode ajudar as organizações a trazer as pessoas de volta ao escritório, cultivar locais de trabalho diferenciados e aumentar a produtividade – e, em última análise, melhorar o desempenho organizacional geral.
A situação do capital social
Décadas de pesquisas acadêmicas sobre o capital social revelaram os claros benefícios deste para indivíduos e organizações – entre os quais menos rotatividade, melhor desempenho nos níveis da equipe e do indivíduo, mais transferência de conhecimento, mais inovação e mais mobilidade na carreira.8
Nossas próprias pesquisas sobre o capital social mostram que os funcionários que se sentem mais conectados com as pessoas de sua rede são duas vezes mais propensos do que aqueles que se sentem menos conectados a relatar graus mais altos de apadrinhamento (ou de defesa por parte de um líder sênior ou colega em prol de seu avanço na carreira), uma vez e meia mais propensos a relatar um senso de pertencimento no trabalho e uma vez e meia mais propensos a relatar envolvimento no trabalho.
Entretanto, a pesquisa também revela uma desaceleração do desenvolvimento de relacionamentos baseados em trocas no local de trabalho desde o início da pandemia de COVID-19.
Motivação para construir capital social
Menos da metade dos entrevistados de nossa pesquisa relatam se empenhar para construir sua rede. Desde o início da pandemia de COVID-19, apenas 24% dos mais de 5,5 mil entrevistados estão focados em se comunicar com antigos contatos de sua rede profissional. Somente 28% estão focados em construir novos relacionamentos, e 31% afirmam estar focados em fortalecer os relacionamentos existentes. Esses dados corroboram outras pesquisas que mostram que, durante a pandemia, os funcionários se voltaram para dentro e focaram principalmente em manter as conexões com associados próximos e membros de sua própria equipe, em vez de construir ou manter relacionamentos com colegas mais novos ou outros associados indiretos.9
A falta de motivação para construir capital social estava presente em todos os setores, embora as porcentagens variassem de um setor para outro. Em torno de 53% dos funcionários do setor de tecnologia, por exemplo, relatam estar mais propensos a investir no fortalecimento das relações existentes, em comparação com apenas 12% dos funcionários do setor público. Há uma série de motivos para essa disparidade – entre eles, o maior acesso dos trabalhadores de tecnologia às ferramentas e plataformas necessárias para criar e manter comunicações remotas.
A diferença de motivação de acordo com o gênero e a função corporativa é marcante. Por volta de um terço dos homens de nossa pesquisa relatam investir energia na comunicação com contatos antigos, na construção de novos relacionamentos e no fortalecimento dos existentes. Em contraste, apenas um quarto das mulheres de nossa pesquisa está fazendo o mesmo, o que suscita questões sobre o enfraquecimento da rede das mulheres em um momento em que elas estão abandonando a força de trabalho em maior número (Quadro 1).10 Ao mesmo tempo, aproximadamente metade dos líderes seniores de nossa pesquisa relata investir energia na construção de suas redes, em comparação com apenas cerca de 15% dos trabalhadores da linha de frente.
Menos surpreendente é o fato de que cerca de metade dos trabalhadores não tradicionais (ou seja, aqueles que atuam como freelancers ou temporários) de nossa pesquisa relatam um investimento quase igual de energia no cultivo de contatos antigos e novos. Afinal, os trabalhadores não tradicionais precisam de uma grande quantidade de conexões para conseguir trabalho.
Acesso ao capital social
Os funcionários em geral relatam ter menos acesso ou sentir-se menos conectados a pessoas de dentro e de fora da rede de sua empresa. Dos mais de 5,5 mil entrevistados de nossa pesquisa, apenas 14% relatam que sua rede cresceu desde o início da pandemia de COVID-19; 22% relatam sentir-se mais conectados com as pessoas da rede de sua empresa; e 17% dizem ter tido mais contato com pessoas de fora da rede de sua empresa.
Novamente, a falta de acesso ao capital social é desigual entre os setores. Por exemplo, cerca de 30% dos funcionários dos setores bancário e de tecnologia relatam ter mais contato com sua rede desde o início da pandemia. Em contraposição, menos de 10% dos funcionários dos setores público, de consumo e varejo, de educação e de saúde relatam o mesmo (Quadro 2).
A falta de acesso é maior entre as mulheres e os trabalhadores da linha de frente. Somente 11% das mulheres de nossa base de pesquisa (ante 17% dos homens) dizem que sua rede cresceu nos últimos dois anos. Apenas 16% das mulheres (ante 28% dos homens) relatam sentir-se mais conectadas, e apenas 12% das mulheres (ante 24% dos homens) relatam ter mais contato com sua rede. Em parte, isso pode ser reflexo das demandas adicionais que as mulheres assumiram durante a pandemia de COVID-19.11
Enquanto isso, meros 9% dos trabalhadores da linha de frente relatam sentir-se mais conectados com sua rede nos últimos anos, em comparação com 22% dos gerentes de nível médio e 45% dos líderes seniores (Quadro 3).
O acesso ao capital social permaneceu estável para os trabalhadores não tradicionais em comparação com os trabalhadores tradicionais. Vinte e oito por cento dos trabalhadores não tradicionais de nossa pesquisa relatam que sua rede cresceu, ante 12% dos trabalhadores tradicionais, e 45% relatam sentir-se mais conectados à sua rede, em comparação com apenas 19% dos trabalhadores tradicionais.
Em termos gerais, os entrevistados de nossa pesquisa relatam interagir mais frequentemente com os contatos de dentro de sua empresa do que com os de fora.12 E os números indicam que essas interações são principalmente transacionais: 57% dos entrevistados relatam compartilhar com os contatos informações relacionadas ao trabalho, 48% relatam compartilhar conselhos sobre a carreira e apenas 29% relatam participar de atividades sociais com os contatos de sua rede.
Capacidade de construir capital social
Nossa pesquisa revela que cerca de metade dos entrevistados sentem que sabem construir e manter sua rede. Quarenta e seis por cento dizem acreditar que construir suas conexões profissionais faz parte de seu trabalho; 47% relatam ter tempo para construir ou manter sua rede – embora esses números sejam menores entre os trabalhadores da linha de frente do que entre os líderes seniores e gerentes de nível médio, provavelmente por causa da estrutura dos empregos de linha de frente e da ênfase em tarefas de curta duração.
As diferenças acima mencionadas entre os trabalhadores tradicionais e os não tradicionais em termos de motivação e de acesso parecem desaparecer quando se trata da capacidade de construir capital social. Quarenta e nove por cento dos trabalhadores não tradicionais relatam sentir que sabem aumentar e manter sua rede, ante 54% dos trabalhadores tradicionais. Quarenta e quatro por cento dos trabalhadores não tradicionais relatam acreditar que construir sua rede profissional faz parte de seu trabalho, ante 46% dos trabalhadores tradicionais. E cerca de metade dos trabalhadores não tradicionais e dos tradicionais (46% e 47%, respectivamente) relatam ter tempo para construir ou manter sua rede.
Como construir (ou reconstruir) o capital social
Nossas pesquisas revelam as deficiências que as empresas estão enfrentando no que diz respeito às conexões no local de trabalho, mas os líderes empresariais precisarão fazer suas próprias avaliações sistemáticas da situação do capital social em sua organização e, com base em seu ponto de partida, desenvolver um conjunto direcionado de iniciativas personalizadas em toda a organização para reduzir quaisquer discrepâncias. As pesquisas da McKinsey mostram que é mais provável haver adesão às mudanças quando os líderes explicam de forma clara e frequente a necessidade delas, atualizam sistemas e processos formais para reforçá-las, atuam eles mesmos como modelos das novas maneiras de trabalhar e garantem que os funcionários recebam o coaching e o treinamento de que necessitam para serem bem-sucedidos.
Motivação: redefinir funções e responsabilidades
As empresas podem apresentar o capital social como um fator crítico no desenvolvimento da carreira dos funcionários, incentivá-los a construí-lo e cobrar responsabilidade deles com relação a isso. Os líderes seniores de uma empresa de varejo, por exemplo, estão reavaliando seus indicadores-chave de desempenho (KPIs, na sigla em inglês) para determinar se precisam incluir mais indicadores relacionais (como métricas vinculadas à colaboração, aprendizagem e realização de conexões) e reduzir as metas operacionais, a fim de dar aos funcionários mais tempo para construírem relacionamentos e comunidade. A equipe acredita que essa abordagem será compensadora com o passar do tempo, ao aumentar o compartilhamento de conhecimentos e o envolvimento dos funcionários.
Os líderes empresariais também devem reservar um tempo para determinar onde está faltando motivação – nossos próprios dados indicam preocupações com as mulheres e os trabalhadores da linha de frente, por exemplo. Esses líderes podem criar mapas de calor dos grupos de recursos de funcionários atuais e outros grupos de afinidade formados para quem tem interesse em se conectar com outras pessoas. Essa avaliação pode apontar para grupos críticos que estão se sentindo excluídos. Uma vez de posse dessas informações, os líderes empresariais podem investir em programas que incentivem a participação dos funcionários em redes externas (congressos profissionais, por exemplo), promovam as interações entre colegas atuais ou antigos e criem conexões com ex-funcionários. Ou podem direcionar recursos a oportunidades de networking para mulheres, trabalhadores da linha de frente e outros grupos desproporcionalmente afetados.
No longo prazo, os líderes empresariais podem ter como objetivo reprogramar todo o seu sistema de talentos – do recrutamento à gestão de desempenho – para motivar os funcionários a focar no capital social. Isso pode envolver a inclusão de termos como “conectividade” e “colaboração” nas descrições de cargos, citando o capital social explicitamente como um dos valores principais da organização e recompensando funcionários de todos os níveis por encontrar, construir e manter o capital social. Uma empresa de serviços industriais dos EUA, por exemplo, instituiu um programa nacional de indicações que recompensava os funcionários por indicar possíveis candidatos a qualquer função em qualquer cidade e que usava as conexões resultantes para fortalecer seu processo de recrutamento. Algumas empresas, por sua vez, estão reformulando suas entrevistas de desligamento como apresentações à rede de ex-funcionários, de modo que os funcionários possam manter uma conexão com a organização.
Acesso: mapear as suas redes
Os resultados de nossa pesquisa mostram que o acesso ao capital social é um fator de atração particular para os funcionários, muitos dos quais relatam sentir-se menos conectados com pessoas de dentro e de fora da rede de sua empresa desde o início da pandemia de COVID-19. Para aumentar o acesso, os líderes empresariais devem primeiramente saber quem o tem – e quem não o tem. Com advanced analytics, pode ser mais fácil do que nunca obter essas informações.
Uma empresa de eletrônicos, por exemplo, está usando metadados de RH, instalações e operações (convites nas agendas, e-mails, sistemas de informações de RH e assim por diante) e advanced analytics para mapear os fluxos de conhecimentos e outras trocas interpessoais em toda a organização. A empresa pôde identificar os funcionários mais conectados e influentes e envolveu esses influenciadores de maneira sistemática como parceiros críticos na criação de mais conexões entre indivíduos e grupos que, de outra forma, provavelmente não teriam se reunido. Por meio de seu mapeamento de conhecimentos, a empresa criou um processo confiável e repetível para monitorar agrupamentos comunitários e identificar oportunidades de construir ou fortalecer o capital social.
Outras empresas têm utilizado programas de apadrinhamento e mentoria para promover conexões entre os funcionários e institucionalizar a importância do capital social. A título de exemplo, uma empresa de tecnologia instituiu um serviço de indicação de mentores para desenvolvedoras de software depois que uma pesquisa revelou que menos de um terço delas relatava ter um mentor na empresa. E uma empresa multinacional faz questão de premiar todos os anos os “superpadrinhos” de todas as regiões e unidades de negócios. As premiações anuais levaram outros funcionários a se voluntariar para se tornar padrinhos e mentores, aumentando, assim, o quociente de capital social da empresa.
Habilidade: romper barreiras organizacionais
Os líderes empresariais podem pensar em avaliar não só as capacidades dos funcionários, mas também sua mentalidade e seu comportamento com relação à construção de capital social. Podem realizar grupos focais com os funcionários para saber mais sobre o que os impede de construir e manter sua rede. No caso das interações presenciais, por exemplo, os líderes podem redesenhar os espaços de escritório para que permitam encontros espontâneos entre funcionários que eventualmente estejam se sentindo menos conectados. Para esse fim, eles podem montar mais salas de reunião para incentivar a colaboração. Ou podem garantir que espaços de escritório privativos estejam disponíveis para as pessoas que desejem ou precisem deles, mas também criar algumas áreas de estar abertas para promover interações casuais. A empresa de varejo mencionada anteriormente reestruturou sua semana de trabalho para garantir que, quando os funcionários estão no local, o tempo seja usado deliberadamente para criar conexões (como sessões de brainstorming e atualizações de status em grupo), em vez de cada funcionário realizar um trabalho solitário de cabeça baixa, o que pode ser mais adequado para o trabalho remoto.
Outra boa medida é os líderes empresariais incorporarem discussões sobre o capital social a seus programas de aprendizagem – sobretudo aos programas de desenvolvimento de liderança – para garantir que todos saibam a importância dele, como construir e manter conexões e como incentivar outras pessoas a fazer o mesmo.
Muitas vezes, os líderes empresariais pressupõem que os relacionamentos no local de trabalho simplesmente acontecem – e talvez isso até fosse verdade antes do início da pandemia de COVID-19. Porém, em um mundo de trabalho híbrido no pós-pandemia, onde o bebedouro é provavelmente virtual e o horário de trabalho dos membros da equipe no escritório pode ser escalonado, os líderes empresariais devem pensar na colaboração e na conectividade de forma diferente. Os funcionários estão buscando conexão, sentido e propósito no trabalho. O capital social deixou de ser apenas algo que é bom ter. Ele vem se tornando uma das principais ferramentas que os líderes empresariais podem usar para atrair e reter funcionários e trazer à tona o que eles têm de melhor, permitindo que atinjam (e até mesmo superem) suas metas de desempenho. Contudo, os líderes devem gerir o capital social da mesma forma que gerem outros tipos de capital corporativo: de maneira deliberada.