The McKinsey Podcast

Liderando de dentro para fora: por que CEOs precisam reservar um tempo para a autorreflexão

| Podcast

Observação: Nós nos empenhamos ao máximo para manter o espírito e as nuances originais de nossos artigos. Porém, pedimos desculpas desde já por quaisquer erros de tradução que você venha a notar. Seu feedback é bem-vindo através do e-mail reader_input@mckinsey.com

Mais insights da McKinsey em português

Confira nossa coleção de artigos em português e assine nossa newsletter mensal em português.

Navegue pela coleção

Os melhores CEOs são sempre motivados, decisivos e confiantes. Mas Ramesh Srinivasan, sócio sênior da McKinsey, Hans-Werner Kaas, sócio sênior emérito, coautores do recém-lançado The Journey of leadership: How CEOs can learn to lead from the inside out, afirmam que os CEOs precisam incorporar uma camada extra de habilidades pessoais e interpessoais – uma que inclua autoconsciência, humildade e compaixão – para inspirar seu pessoal. Neste episódio de The McKinsey Podcast, Srinivasan e Kaas conversam com a diretora editorial Roberta Fusaro sobre o desafio da reinvenção pessoal com vistas ao bem maior da empresa.

A transcrição a seguir foi editada para maior clareza e concisão.

The McKinsey Podcast é coapresentado por Roberta Fusaro e Lucia Rahilly.

Líder, conhece-te a ti mesmo

Roberta Fusaro: Vocês e seus coautores acabaram de lançar um novo livro, The journey of leadership: How CEOs can learn to lead from the inside out. Poderiam explicar, em termos simples, o que significa liderar “de dentro para fora”?

Ramesh Srinivasan: O mundo está mudando rapidamente. A geopolítica tornou-se bastante complexa, a tecnologia tem enorme impacto e as mudanças climáticas vieram para ficar. Diante desse contexto, sentimos que o mundo precisava de um novo paradigma de liderança, que chamamos de liderança centrada no ser humano. Acreditamos que os líderes devem refletir a fundo sobre seu propósito, identidade, posicionamento no mundo e como inspirar suas equipes e as instituições que lideram.

Hans-Werner Kaas: A liderança centrada no ser humano é o referencial definitivo para todos os líderes, qualquer que seja sua formação ou nível hierárquico. Somado a todas as ações que os líderes empreendem para alcançá-lo, esse modelo é essencial para que sejam realmente valorizados por seus colegas e stakeholders.

A noção de “dentro para fora” significa que toda mudança começa com nós mesmos. Precisamos ter plena consciência de quem somos – e de nossas palavras, comportamentos e ações – para podermos então refletir sobre nossas qualidades e pontos fracos. Um bom nome para isso seria autodesenvolvimento, que implica atitudes humanas como empatia, desvelo, compaixão, humildade e vulnerabilidade – e, às vezes, determinação, confiança e resiliência. Mas o equilíbrio ideal entre esses variados tipos de comportamento realmente dependerá de cada situação de liderança.

Por que isso, por que agora?

Roberta Fusaro: Por que isso, por que agora? Ramesh, você começou a responder. Os desafios para os líderes hoje, em 2024, são muito diferentes. Poderia falar um pouco sobre o que exatamente mudou?

Ramesh Srinivasan: A geopolítica mundial se tornou muito mais complicada. A tecnologia, inteligência artificial e IA generativa também estão tendo enorme impacto. Em meio a todas essas mudanças, os líderes precisam ter uma noção clara de quem eles de fato são, de seu propósito e do que os motiva. Como eles se apresentam ao mundo? Sobre o que conversam? O que podem fazer para entender mais a fundo os membros de sua equipe como seres humanos a fim de inspirá-los no espírito do propósito coletivo? E como podem se valer de tudo isso para inspirar as organizações e instituições das quais fazem parte?

Os líderes precisam ter uma noção clara de quem eles de fato são, de seu propósito e do que os motiva.

Ramesh Srinivasan

Roberta Fusaro: Hans-Werner, você mencionou que essa abordagem de dentro para fora é intensamente pessoal. O livro incentiva os líderes a examinarem mais de perto suas vulnerabilidades, talvez suas inseguranças – o que pode ser um pouco assustador. Estou curiosa, como o livro pode ajudar a facilitar esse processo para os CEOs e demais líderes?

Hans-Werner Kaas: O livro traz histórias de 24 CEOs, alguns em atividade, outros não. São relatos profundamente pessoais, nos quais revelam suas inseguranças, suas dificuldades, como as enfrentaram e buscaram superá-las. Nenhum desses 24 CEOs afirma já ter alcançado seu destino final, mas todos disseram que estão em uma trajetória promissora para se tornarem líderes mais eficazes e centrados no ser humano.

O livro inclui ainda um “manual de reinvenção” com descrições passo a passo para ajudar o líder nesse processo de autotransformação.

Uma série de atos de equilibrismo

Roberta Fusaro: O livro é dividido em duas partes, o que é bastante útil: os aspectos psicológicos e emocionais de liderar a si mesmo, e o lado humano de liderar os outros. Ramesh, dentre os capítulos que discutem humildade, confiança, altruísmo, vulnerabilidade, resiliência e versatilidade, existe algum traço característico ou campo de interesse que seja mais importante ou mais difícil de aprimorar do que os outros?

Ramesh Srinivasan: Acreditamos que todos são muito importantes, mas o traço pessoal com o qual eu gostaria de começar é o equilíbrio entre coragem e curiosidade. Temos o exemplo de Stéphane Bancel, que explica como, no auge da pandemia, precisou tomar a decisão audaciosa de desenvolver e produzir uma nova vacina, algo que a Moderna nunca havia feito antes.

Ele teve a coragem de definir uma visão ousada e inspirar sua equipe. Ao mesmo tempo, instigou um grau extraordinário de curiosidade, ciente de que havia muitas coisas fora da sua área de expertise – não só a produção da vacina em si, mas a fabricação de um bilhão de doses dela.

Outro traço é o equilíbrio entre confiança e humildade. Lynn Elsenhans exemplifica esse equilíbrio de maneira admirável. Quando era CEO, às vezes tinha que participar de reuniões em que era a única mulher, mas sempre demonstrava a inabalável confiança de que pertencia àquele espaço. Como líder, ela tem imensa autoconfiança, algo evidenciado em todas as nossas interações. No entanto, é também extremamente humilde, com ambos os pés firmemente no chão, no modo como atua e inspira sua equipe.

Hans-Werner Kaas: Um exemplo adicional que me vem à mente é o de Mark Fields, ex-CEO da Ford Motor Company. Quando se tornou CEO da Mazda Motor Corporation, que era parte do grupo Ford no ano 2000, decidiu que seria muito melhor se ele fosse humilde nos primeiros seis meses. Embarcou então em uma missão de ouvir os outros e praticar a humildade. Em momento algum pretendeu ter todas as respostas, embora tivesse uma visão clara e várias hipóteses sobre as soluções para a empresa. E soube exercer esse equilíbrio entre confiança e humildade – e também vulnerabilidade – admitindo que nem todas as respostas lhe eram óbvias e que seria necessário um esforço cocriativo em equipe para chegar a elas.

Há também o exemplo da aprendizagem profunda. O almirante Eric Olson, ex-chefe do Comando de Operações Especiais dos EUA e um SEAL1 da Marinha, fala no livro sobre o que chama de “aprendizado destemido”. Ele afirma que uma das habilidades mais importantes é não temer que nossas suposições possam estar erradas. Pelo contrário, precisamos estar sempre dispostos a descartá-las, se necessário. Destaca que nenhum plano sobrevive ao primeiro contato com o inimigo, salientando a importância de adaptar-se ao terreno quando o terreno difere do mapa. Isso significa elaborar um novo plano e formular novas suposições para aumentar as chances de sucesso de uma missão.

A jornada para dentro de si

Roberta Fusaro: Hans-Werner, você mencionou que a ideia de autoconsciência é crítica ao sucesso nessa jornada de dentro para fora. Mas CEOs, líderes e líderes militares já têm uma agenda bem cheia. Como eles podem encontrar tempo para romper com os padrões do dia a dia e se dedicarem à autorreflexão?

Hans-Werner Kaas: É muito difícil. Todos nós vivenciamos isso em nossos empregos e profissões. Mas eu remeteria ao que descrevemos no livro como micropráticas.

Quanto a reservar tempo para adquirir autoconsciência, precisamos primeiro entender nossa situação: por que é tão difícil abrir tempo para isso? Em seguida, devemos considerar algumas ações práticas: por exemplo, não utilizar nenhum dispositivo digital durante uma hora ao acordar e aproveitar esse período para avaliar mentalmente nosso dia, sem interagir com ninguém. Estaremos a sós com nossos pensamentos, a sós com nossas prioridades. Desse modo, estaremos abertos para refletir sobre nossas realizações recentes, o que fizemos na véspera, na semana passada, e qual impacto que nossas palavras e atitudes tiveram sobre os outros.

Isso é crucial, pois autoconsciência significa entender as implicações de nossas palavras e pensamentos nos outros. É algo fundamental para a liderança. O segundo passo é a autorreflexão, isto é, a elaboração de práticas comportamentais de aprimoramento pessoal. De modo que a sequência é essa.

Ramesh Srinivasan: Eu acrescentaria mais uma ideia. No livro, o ex-CEO de uma empresa de mídia discute a importância de encontrar na organização pessoas dispostas a falar a verdade. Em geral, à medida que ascendem a hierarquia, as pessoas vão ficando menos propensas a nos dizer a verdade e a oferecer sugestões específicas sobre como podemos evoluir como líderes. Portanto, para se ter uma boa noção do que acontece na empresa, é essencial implementar uma cultura na qual as pessoas se sintam seguras, e também reservar tempo para conhecer os subordinados e o pessoal da linha de frente que tem contato com os clientes – o que também pode ser uma ótima fonte de insights para autorreflexão subsequente.

Os seres humanos ainda estão no comando

Roberta Fusaro: Ramesh, você mencionou que a IA generativa é uma das grandes mudanças que os líderes enfrentam hoje e destacou a importância da liderança centrada no ser humano diante de todas as transformações que estão ocorrendo. Vocês poderiam falar um pouco mais sobre essa abordagem de liderança no contexto da IA generativa e de outras tecnologias emergentes?

Ramesh Srinivasan: Vejo a tecnologia tendo um impacto enorme no mundo. No entanto, em nosso trabalho, em todas as nossas pesquisas, sentimos que o valor e o papel do ser humano não vão desaparecer. O desafio para os líderes é entender qual é o impacto da tecnologia sobre si mesmos, suas equipes e suas empresas.

Sobre o modo como os papéis do líder e do ser humano estão evoluindo, Hans-Werner destacou o valor da empatia, da capacidade de ouvir os outros e da criatividade. Não acreditamos que essas dimensões irão desaparecer, de modo que a grande pergunta para os líderes é: Como aproveitar essas habilidades para que as instituições que lideram saibam empregar a tecnologia em prol da sociedade, dos clientes e dos funcionários?

A grande pergunta para os líderes é: Como aproveitar essas habilidades para que as instituições que lideram saibam empregar a tecnologia em prol da sociedade, dos clientes e dos funcionários?

Ramesh Srinivasan

Hans-Werner Kaas: Como Ramesh disse, em nossa opinião há duas coisas que a IA generativa não conseguirá realizar. Primeiro, ela não será capaz de adquirir o toque emocional do ser humano. E, segundo, embora a IA generativa possa ser uma ferramenta útil para diferentes tipos de líderes, é essencial que estes saibam exatamente onde e até que ponto aplicá-la – sem exageros e sem exaltá-la como a solução para todos os desafios de liderança. Ela não é.

Uma nova era de negócios significa uma nova era de liderança

Roberta Fusaro: Hans-Werner, outro ponto do livro é a noção de CEO imperial. Para todos os efeitos, líderes “maiores que a vida” como Jack Welch e Lee Iacocca não existem mais. Quando e por que isso mudou?

Hans-Werner Kaas: Como Ramesh destacou no início de nossa conversa, as forças em ação – na geopolítica, na tecnologia ou nos movimentos sociais e de sustentabilidade ambiental – mudaram drasticamente desde os anos 1980 e 90.

A era dos CEOs imperiais já findou há tempos e hoje tudo diz respeito à liderança de dentro para fora e centrada no ser humano. Somente assim será possível convidar stakeholders e colegas a se engajarem e oferecerem ideias de forma proativa, deixando para trás ambientes autoritários ou controladores que tratam as pessoas como súditos da gerência.

A era dos CEOs imperiais já findou há tempos e hoje tudo diz respeito à liderança de dentro para fora e centrada no ser humano. Somente assim será possível convidar stakeholders e colegas a se engajarem e oferecerem ideias de forma proativa, deixando para trás ambientes autoritários ou controladores que tratam as pessoas como súditos da gerência.

Hans-Werner Kaas

Roberta Fusaro: Olhando um ou dois anos à frente, que impacto vocês esperam que este livro tenha na comunidade empresarial?

Ramesh Srinivasan: Nossa esperança é que tanto os líderes de negócios como os líderes de impacto social se beneficiem das ideias do livro. Esperamos que líderes de todos os gêneros e de todos os perfis possam se beneficiar do que propiciamos no livro. Esta é nossa primeira expectativa.

Mas também queremos enriquecer o debate sobre liderança. Esperamos que nossos conteúdos e pesquisas se revelem contribuições valiosas. Esperamos que o livro seja um catalisador para fomentar um diálogo com líderes e instituições sobre este tópico, e que os ajude no plano individual e também às suas equipes e às instituições de todo o mundo.

Hans-Werner Kaas: Deixe-me retomar o terceiro ponto que Ramesh levantou. Nossa aspiração é que todos que lerem o livro, ou mesmo partes do livro, se tornem mais centrados no ser humano. Não apenas em sua vida pessoal, mas também em sua vida profissional e em diferentes setores.

E há ainda o processo em si, descrito no capítulo final, “The Journey Never Ends” [A jornada nunca termina]. Na verdade, cada leitor deve definir seu próprio processo e metodologia de autorreflexão e reinvenção pessoal. É algo que pode ser realizado de maneira discreta em seu círculo familiar ou com seu cônjuge. Ou com um ou dois membros de confiança da equipe executiva ou colegas leais da organização. Ou ainda com coaches externos. O importante é encontrar o que chamamos de seu próprio foro de autorreflexão e autorreinvenção.

Explore a career with us