“Você pode não estar interessado em geopolítica, mas a geopolítica está interessada em você.”
—Declaração em outubro de 2023 dos membros da aliança de inteligência Five Eyes dirigida aos líderes de empresas multinacionais ocidentais.
As condições geopolíticas sempre influenciaram o destino das empresas. Mas, pelo menos desde o fim da Guerra Fria, tenderam a ficar em segundo plano em relação às questões macroeconômicas, estratégicas e operacionais.
Não mais.
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Hoje os líderes empresariais veem as tensões geopolíticas como o maior risco para o crescimento econômico, segundo a mais recente Pesquisa Global da McKinsey sobre condições econômicas. Conflitos regionais e divergências comerciais internacionais se intensificaram nos últimos anos, pondo à prova a resiliência e as estratégias das corporações multinacionais. Por exemplo, as tarifas sobre bens comercializados entre Estados Unidos e China aumentaram até seis vezes desde 2017 e, em todo o mundo, as intervenções comerciais cresceram 12 vezes desde 2010.
CEOs e Conselhos sabem que uma grande transformação da ordem mundial está em curso. Contudo, muitos ainda não se deram conta de uma implicação crucial: as mudanças geopolíticas representam não apenas riscos a serem mitigados, mas também oportunidades a serem aproveitadas.
Dadas suas responsabilidades fiduciárias, é compreensível que os líderes empresariais tendam a focar principalmente os aspectos negativos dessas mudanças, fazendo perguntas como: Quais de nossos produtos e operações são suscetíveis à geopolítica e como essa vulnerabilidade varia de região para região? Em que momento precisaremos trocar de fornecedor? Qual percentual de nossa força de trabalho precisa de vistos e como a dificuldade em obtê-los pode afetar nossa produtividade em certas partes do mundo?
É importante elaborar planos de resposta a riscos para lidar com esses e outros possíveis percalços. Contudo, mesmo que consigam aumentar a resiliência da empresa a choques externos, os líderes devem focar seus esforços nas oportunidades de criação de valor ajustado ao risco. Devem customizar as estratégias de crescimento, as operações do negócio principal, os stacks de tecnologia, a atuação dos talentos, os portfólios de ativos de capital e as capacidades organizacionais com vistas a prosperar – e não apenas a sobreviver.
Os líderes empresariais precisam se fazer várias perguntas: Os produtos de nossos concorrentes ficarão mais ou menos caros que os nossos em decorrência das novas tarifas e tributações? Quando e como poderemos alinhar nossos negócios com fluxos comerciais em novos corredores? Quais novas alianças econômicas e de segurança poderão nos criar oportunidades de crescer ou de mudar nossa estrutura de custos? Quais incentivos de política industrial representarão um potencial de crescimento significativo para nós? Como nosso custo de capital ajustado ao risco está mudando em cada região e como otimizar o modo como utilizamos esse capital?
Se a organização conseguir enxergar a geopolítica sob a ótica da criação de valor, poderá auferir benefícios enormes. Consideremos estes exemplos:
- Uma empresa norte-americana de aparelhos médicos que transferir suas operações de produção e sua cadeia de suprimentos de outro país para o México a fim de se beneficiar de acordos comerciais poderá reduzir seus custos operacionais em 15% a 25% e, com isso, aumentar sua resiliência operacional.
- Uma empresa de pagamentos que se mude para a Ásia-Pacífico até 2027 poderá acessar $1,5 trilhão em receitas adicionais.
- Uma empresa de semicondutores que altere sua estratégia de vendas e marketing de modo a incluir clientes no corredor Taiwan-Singapura poderá agregar $47 bilhões a seu market share.
Por outro lado, líderes empresariais que se concentrarem demais nos aspectos negativos acabarão paralisados e perpetuamente em estado de alerta para eventos geopolíticos de alta gravidade, mas baixa probabilidade. Para evitar isso, devem avaliar contínua e sistematicamente todos os direcionadores de valor das políticas comerciais, econômicas, industriais e das áreas de defesa e segurança (Quadro 1). Isso inclui tarifas, subsídios de políticas industriais nacionais e a tendência dos governos de investir em aliados geopolíticos no que tange a cadeias de suprimentos, talentos, tecnologias, dados, utilização de capital e outros domínios de negócios.
Neste artigo, examinamos esses direcionadores de valor e explicamos como uma abordagem geopolítica proativa pode ajudar as empresas a proteger as operações existentes e capturar as oportunidades que estão surgindo em vários segmentos geográficos e setoriais.
Como uma abordagem geopolítica proativa pode gerar valor
Muitos Conselhos e equipes de alta gestão fazem questão de alinhar as estratégias e capacidades corporativas com as realidades do mundo; para tanto, nomeiam um diretor geopolítico, instituem unidades de inteligência geopolítica capazes de fornecer alertas antecipados de eventos emergentes, elaboram planos de resposta que capacitam o CEO em tempos de crise, e/ou protegem suas cadeias de suprimentos de choques externos.
Algumas equipes de liderança mais avançadas dão um passo além e exploram maneiras de criar valor em meio à disrupção geopolítica. Elas têm encontrado oportunidades particularmente em três áreas: aceleração do crescimento, otimização das operações comerciais e desenvolvimento de capacidades e estratégias para dar conta da disrupção global.
Aceleração do crescimento
Para melhorar as decisões de investimento e aproveitar oportunidades comerciais em meio ao turbilhão de tensões globais, os líderes precisam definir o que significa crescimento para a empresa, seus clientes e seus concorrentes. Devem analisar uma variedade de cenários de crescimento que reflitam a implementação de qualquer um dos dez direcionadores de valor descritos no Quadro 1. Por meio deste exercício, poderão encontrar oportunidades para acelerar os negócios ou reequilibrar o portfólio.
Aceleração comercial. Mudanças nas condições geopolíticas podem tornar possível que uma empresa atraia novos clientes e capture mais market share. Oportunidades podem surgir se novas tarifas aumentarem desproporcionalmente o custo do produto de um concorrente, por exemplo, ou se novos acordos comerciais tornarem possível para a empresa vender para clientes que sempre estiveram fora de seu alcance. Por exemplo, a empresa de equipamentos de construção Caterpillar estava bem posicionada para aumentar suas vendas na Austrália e no Chile quando esses países assinaram acordos de livre comércio com os Estados Unidos.
Alterações recentes nos corredores comerciais já estão reconfigurando setores inteiros. Dados do Fundo Monetário Internacional, por exemplo, mostram mudanças significativas nas principais rotas comerciais entre 2021 e 2023, especialmente entre China e Estados Unidos (Quadro 2).
Outras pesquisas mostram que o fluxo líquido de investimentos estrangeiros diretos (IED) para a China caiu de $344 bilhões em 2021 para $42,7 bilhões em 2023, o menor valor em três décadas. Analistas preveem que o redirecionamento dos investimentos provavelmente acelerará na próxima década, de modo que será fundamental que os líderes empresariais monitorem os destinos desse dinheiro.
Reequilíbrio do portfólio. Quando ocorre um choque geopolítico, segmentos de negócios outrora estáveis e de alto crescimento podem sofrer, enquanto segmentos antes negligenciados podem revelar novo potencial. Os líderes empresariais estão cientes de que precisam avaliar e reagir continuamente às mudanças na dinâmica competitiva de seus setores. E agora devem enfrentar as disrupções geopolíticas da mesma forma, avaliando e realocando continuamente o capital para segmentos de maior crescimento e menor risco – por meio de fusões, aquisições ou parcerias – e desinvestindo em áreas de baixo desempenho e alto risco.
Por exemplo, certo fundo de private equity identificou as empresas de seu portfólio que estavam situadas em áreas onde era quase certo que os lucros diminuiriam devido a conflitos regionais e, desse modo, redirecionou-as para locais mais estáveis. Além disso, os executivos do fundo identificaram produtos que tinham um possível “uso duplo” – isto é, aplicações tanto comerciais como militares – e, portanto, estariam sujeitos a fiscalização rigorosa quando cruzassem fronteiras internacionais. E realocaram a fabricação desses produtos para áreas menos suscetíveis às regulamentações de uso duplo antevendo a possibilidade de estas se tornarem mais estritas.
Da mesma forma, uma empresa multinacional de laticínios baseou-se nas tendências globais para elaborar vários cenários geopolíticos possíveis para a década seguinte. Os líderes avaliaram esses cenários em relação a cada um de seus produtos e aos locais em que eram fabricados e vendidos. A partir dessa análise, a equipe executiva decidiu vender uma das unidades de negócio e utilizou o capital obtido para ampliar os investimentos em outra região que, conforme a maioria dos cenários gerados, apresentaria maior crescimento. Como resultado, o preço das ações dessa empresa global de laticínios aumentou mais de 10% no ano fiscal seguinte.
Às vezes, equilibrar o portfólio envolve práticas como hedging, ajuste da intensidade do capital, aumento das reservas de liquidez ou adoção de estratégias de regionalização da produção. Esses movimentos, além de fazerem parte de uma estratégia geral de mitigação de riscos, também podem melhorar a lucratividade. Por exemplo, uma montadora global implementou uma estratégia de hedging que economizou $15 milhões por ano sem alterar seu perfil de risco. A empresa reduziu em 50% o hedging do balanço patrimonial e adotou opções “out-of-the-money” [isto é, que ainda não atingiram o preço de exercício], aprimorando assim a gestão dos recursos. Além disso, ao constatar que as reservas de liquidez estavam excessivamente elevadas, redirecionou o excedente – quase $1 bilhão – para quitar dívidas, reduzir os custos de hedging e aumentar o volume das dívidas flutuantes. Todo o processo começou quando os líderes decidiram investigar a vulnerabilidade da empresa ao contexto geopolítico.
Otimização das operações do negócio principal
Os líderes empresariais podem fortalecer a resiliência da organização avaliando em que medida as mudanças geopolíticas podem impactar o custo/benefício das operações, o que inclui revisar as relações com fornecedores, a estratégia global de talentos, as capacidades internacionais e a infraestrutura tecnológica.
Presença operacional. Uma das decisões mais importantes de qualquer líder é definir onde a empresa investirá em fabricação, armazenamento e engajamento com o cliente, pois essas escolhas podem definir a trajetória da organização. A geopolítica é um fator importante nessas decisões, pois pode viabilizar ou inviabilizar novas fontes de valor. A empresa global de eletroeletrônicos Samsung levou em conta a existência de acordos comerciais favoráveis, os custos competitivos da mão de obra e as vantagens estratégicas de produzir no Vietnã para decidir investir $2 bilhões em capacidade de fabricação adicional naquele país. Por sua vez, a gigante de tecnologia Apple, que tradicionalmente sediava a produção na China, diversificou sua presença manufatureira recentemente ao expandir para a Índia, visando fortalecer sua a resiliência operacional, aproveitar custos competitivos e acessar mercados em crescimento.
Cadeia de suprimentos. Eventos geopolíticos recentes causaram enorme disrupção nas cadeias de suprimentos e o fechamento de inúmeras instalações de distribuição, levando muitas empresas a buscar suprimentos de uma variedade de fornecedores, a abandonar o sistema just-in-time de pedidos e entregas e até mesmo a estocar insumos essenciais. Algumas adotaram tecnologias avançadas para antever e se preparar para futuras disrupções geopolíticas.
Por exemplo, uma empresa de bens de consumo embalados constatou que todo o seu sistema de fornecimento estava passando por mudanças substanciais e decidiu construir um gêmeo digital da cadeia de suprimentos para entender todos os efeitos potenciais dos eventos geopolíticos por trás dessas transformações. As análises conduzidas no ambiente do gêmeo digital levaram a empresa a modificar alguns elementos da cadeia de suprimentos e, com isso, a reduzir sua dependência de fabricantes terceirizados, aprimorar sua gestão de pátio, otimizar o desenvolvimento da mão de obra e organizar um mix mais robusto de transportadoras. Essas alterações permitiram reduzir as despesas operacionais gerais e projetar um crescimento maior para o ano fiscal seguinte.
Outras empresas estão tirando proveito de políticas industriais que incentivam a produção doméstica ou a consolidação da cadeia de suprimentos no próprio país. A empresa de carros elétricos Tesla, por exemplo, resolveu aproveitar os subsídios fiscais introduzidos pelo Inflation Reduction Act de 2022 para fortalecer sua cadeia de suprimentos: não só passou a adquirir materiais no mercado doméstico, como também transferiu suas instalações fabris da Alemanha para os Estados Unidos. Mais recentemente, o México propôs subsídios fiscais para atrair empresas estrangeiras dispostas a adquirir insumos no país.
Presença de talentos. As tensões geopolíticas podem complicar a gestão de talentos e impedir a coesão da força de trabalho entre culturas e nacionalidades. Felizmente, há medidas que as empresas podem tomar para dar conta dessas disrupções, como revisar os padrões de concentração de talentos, reequilibrar as alocações da força de trabalho e trazer funções importantes (como recursos humanos ou suporte de TI) para o próprio país.
A Egis, empresa de engenharia, construção e desenvolvimento urbano que atua na Ucrânia desde 1993, adotou o trabalho remoto logo após a deflagração do conflito com a Rússia e, com isso, tem sido capaz de manter suas operações e assegurar sua produtividade.
Um banco global com serviços de back-office e call centers em várias regiões do mundo conduziu uma avaliação geopolítica e identificou dificuldades para encontrar e contratar talentos em certos países. A equipe executiva do banco também projetou que os custos operacionais nesses locais provavelmente aumentariam devido a mudanças iminentes em acordos comerciais internacionais. Com base nesses dados, decidiu transferir funcionários de regiões onde o custo dos vistos e os obstáculos comerciais eram mais onerosos, redirecionando seus esforços de contratação de pessoal para novas regiões menos suscetíveis a riscos geopolíticos.
Talentos digitais estão sempre em falta e algumas empresas têm recorrido a trabalhadores expatriados para preencher essa lacuna – o que, por sua vez, aumenta sua vulnerabilidade a mudanças na legislação de vistos e imigração. Uma maneira de evitar ou mitigar esse risco é criar centros de desenvolvimento em regiões ricas em talentos digitais – por exemplo, Índia, México, Filipinas e Polônia – e onde os governos oferecem incentivos para empresas que desejam realocar seus profissionais.
Tecnologia e dados. As organizações multinacionais têm criado funções de tecnologia nas quais os talentos, a infraestrutura e os dados se estendem além das fronteiras nacionais, o que deixa seus stacks de tecnologia e outros recursos expostos a turbulências geopolíticas. As ameaças são inúmeras e incluem ataques cibernéticos, roubo de propriedade intelectual, exigências de consolidação local dos dados, possíveis disrupções provocadas por conflitos comerciais e fragmentação da legislação de dados e de TI em todo o mundo.
As empresas líderes de TI de todo o mundo precisam reavaliar continuamente sua presença tecnológica e o impacto de seus dados (e também os de seus fornecedores) para se protegerem de choques externos e assegurar resiliência e agilidade diante das mudanças geopolíticas. O gigante online Google decidiu construir centros de dados na Finlândia para aproveitar os abundantes recursos de energia renovável do país e tentar atingir suas metas declaradas de sustentabilidade e neutralidade de carbono. Da sua parte, a Malásia vem oferecendo incentivos fiscais e criou a iniciativa Digital Ecosystem Acceleration para atrair empresas que buscam novos locais para seus centros de dados – Google e Microsoft são algumas que já estão investindo na região.
As capacidades e estratégias necessárias para reagir à disrupção geopolítica
Uma coisa é um executivo de uma empresa conhecer os possíveis prós e contras dos eventos geopolíticos; outra completamente diferente é a organização ter as capacidades necessárias para reagir a eles – incluindo estratégias corporativas que levem em consideração a geopolítica e estruturas de capital que sejam sensíveis às realidades geopolíticas.
Ampliar a noção de estratégia corporativa. Assim como as empresas monitoram rotineiramente as políticas regulatórias e tributárias e demais diretrizes locais que afetam diretamente suas estratégias de negócio, elas também devem monitorar os riscos geopolíticos e as políticas econômicas dos países em que operam. Mas precisam ter em mente que as influências geopolíticas tendem a ser incertas e interligadas, pois as ações de um país geram reações de outro, de tal modo que os líderes devem incorporar considerações geopolíticas em seus exercícios regulares de planejamento da estratégia e dos negócios, e envolver o Conselho nessas questões.
Os líderes devem começar identificando quais mudanças geopolíticas e econômicas globais possivelmente terão maior impacto em seus interesses corporativos. Quais vulnerabilidades, lacunas de capacitação e oportunidades de crescimento serão reveladas por essa avaliação? Existem decisões estratégicas que os líderes precisariam ajustar no caso de haver alterações nas diretrizes ou políticas? Qual valor pode ser gerado sob uma variedade de cenários? Vale lembrar que certos investimentos de capital (como oleodutos, gasodutos, fábricas de semicondutores, usinas de energia ou minas) podem levar décadas para construir, atravessando vários governos e ciclos eleitorais.
Se as mudanças políticas afetarão as decisões estratégicas de uma empresa dependerá do seu apetite por riscos. Quanto ela está disposta a investir para aproveitar oportunidades de crescimento incertas, mas potencialmente significativas? Que tipos de seguros devem ser adquiridos para mitigar os maiores riscos? Para aprofundar a análise dessas questões, os líderes empresariais fariam bem em participar de atividades de planejamento de cenários e de exercícios simulados em ambientes controlados. Nesses exercícios, conhecidos como tabletop, os participantes assumem diferentes papéis e discutem maneiras possíveis de reagir a uma série de disrupções hipotéticas – por exemplo, a eclosão de conflitos locais, novas ameaças à segurança ou alterações nas tarifas ou políticas setoriais. Essas práticas também podem orientar líderes e membros do Conselho a se concentrar nas decisões que estão sob seu controle, em vez de se ficarem tentando prever o que poderá ou não acontecer.
Preparar as organizações multinacionais para o futuro. O aumento recente no número de barreiras comerciais e não comerciais afetou desproporcionalmente os negócios globais, tornando ainda mais importante que as corporações multinacionais antevejam o impacto de eventuais novas leis, políticas e regulamentações. Sem tal antevisão, elas poderão se ver forçadas a sair de certos mercados, implicando custos financeiros e de reputação. Por exemplo, a BP deixou a Rússia três dias após o início da guerra na Ucrânia, renunciando à sua participação na empresa russa de petróleo e gás Rosneft. Com isso, precisou contabilizar perdas de $24 bilhões em seu balanço financeiro e viu seus lucros anuais serem reduzidos em $2 bilhões. Algumas empresas têm preferido confiar na segmentação estrutural para garantir a continuidade da produção, contratação e gestão de talentos, cadeia de suprimentos, P&D e outras atividades operacionais no caso de uma divisão ou região ser eliminada. Essas mesmas empresas capacitaram seus líderes e equipes para tomar decisões no nível local e criar trajetórias estáveis de crescimento. Por exemplo, o HSBC reorganizou recentemente seus negócios, segmentando-os nas divisões Oriente e Ocidente, para simplificar a estrutura de governança e reduzir riscos.
Outras empresas estão voltando a pensar no chamado “planejamento de recuperação e de resolução”, que surgiu inicialmente na esteira da crise financeira de 2008 e vem ganhando força diante do surgimento de tantas disrupções geopolíticas. Trata-se, em suma, de exigir que grandes instituições financeiras (e algumas outras empresas específicas) detalhem sua estratégia para resolver, de forma rápida e ordenada, situações de grandes dificuldades financeiras ou de falência. No contexto geopolítico atual, é essencial que os líderes empresariais envolvam o Conselho e os comitês de risco nas discussões, que ajudarão a fiscalizar tanto as agendas de crescimento como as de mitigação de riscos.
Formar um grupo funcional dedicado à geopolítica. De modo geral, as empresas que reagem mais rapidamente às disrupções geopolíticas são aquelas que as incorporam como parte essencial de suas decisões operacionais e de investimento. Muitas formam grupos funcionais que se dedicam a monitorar o cenário geopolítico, fazer prognósticos, planejar cenários variados e manter a alta liderança e o Conselho bem informados para que possam reagir prontamente. Um grupo funcional interno, liderado por um diretor de geopolítica e composto por uma equipe especializada, garantirá que a empresa esteja bem posicionada para aproveitar não só as mudanças que ocorrem hoje no mundo, mas também as que inevitavelmente surgirão. Essa estrutura promove encontros regulares em que o Conselho e a alta liderança podem discutir em detalhes, de forma matizada, as oportunidades e os riscos geopolíticos, permitindo-lhes reagir rapidamente e, no longo prazo, instituir uma cultura organizacional de resiliência geopolítica.
Elaborar um manual de resposta a crises. Eventos geopolíticos podem colocar uma organização em situação de crise. Em nossa experiência, as que se recuperam mais rapidamente tendem a ser aquelas que souberam compilar os resultados de seu planejamento de cenários e de seus exercícios simulados em um manual de resposta a crises. Esse tipo de manual é um excelente ponto de partida para avaliar o possível impacto de conflitos locais, tarifas inesperadas, mudanças de política ou outros eventos imprevistos. Embora os resultados futuros continuem sendo incertos, líderes e equipes terão a garantia de contar com diretrizes claras para enfrentar o período de volatilidade. Por exemplo, o manual anticrise de uma empresa de semicondutores delega responsabilidades específicas ao CEO no caso de disrupção da cadeia de suprimentos, mas também incumbe outros executivos de gerenciarem outros aspectos da crise, assegurando que todos se mantenham focados e produtivos mesmo durante uma transformação significativa da base de suprimentos.
Como o panorama que descrevemos aqui deixa claro, uma abordagem geopolítica proativa é essencial. Mas é também uma grande empreitada, que exige que as organizações possuam as capacidades certas e sejam capazes de antever, perceber e conter o que acontecerá. Acima de tudo, porém, elas devem ter coragem e determinação para aproveitar as oportunidades que surgem em meio à volatilidade, complexidade e incerteza. O esforço vale a pena: os executivos que refletirem a fundo sobre as transformações na ordem mundial e souberem como reagir a elas se destacarão como os líderes de mercado do futuro.