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Com a desaceleração do crescimento das vendas de veículos elétricos a bateria (BEV) na maioria dos mercados, a indústria automotiva está avaliando novos métodos para promover a eletrificação. Juntamente com os veículos elétricos híbridos recarregáveis (PHEV), os veículos elétricos de alcance estendido (EREV) estão ressurgindo como uma possível solução para reduzir a preocupação com o custo e a autonomia da opção elétrica entre os atuais proprietários de veículos com motor de combustão interna (MCI), híbridos e elétricos.
Muitos compradores potenciais de veículos elétricos (EVs) relutam em pagar um ágio para adquirir um BEV em vez de um veículo com motor de combustão interna. Além do preço, a autonomia é uma das principais fontes de desconforto entre os compradores de carros. Para aqueles que moram em apartamentos ou outro tipo de residência sem acesso fácil à recarga noturna, e também para motoristas que planejam viagens longas, a extrema escassez de recarregadores públicos pode ser uma preocupação. E embora o percurso diário da maioria dos motoristas não ultrapasse 80 km, muitos percorrem trajetos bem mais longos.
Os EREVs possuem a capacidade intrínseca de atenuar a chamada “ansiedade de alcance” e, tendo em vista o ritmo vigoroso de vendas na China, atraíram a atenção dos OEMs da Europa e Estados Unidos como uma possível forma de impulsionar o crescimento das vendas de todos os veículos elétricos. Os EREVs foram parte da primeira onda de eletrificação ocorrida há uma década, mas não decolaram porque os consumidores pioneiros, movidos pelo espírito da inovação, estavam mais interessados em veículos elétricos puros. Hoje, os compradores de veículos elétricos não são fanáticos por tecnologia, mas pessoas comuns em busca de uma gama maior de opções. Embora semelhantes aos PHEVs, os EREVs possuem não só um trem de força elétrico, mas também um pequeno gerador alimentado por um MCI, e conseguem oferecer autonomia elétrica de 160 a 320 quilômetros (em comparação com apenas 30 a 60 quilômetros de um PHEV comparável) e autonomia total de 650 a 800 quilômetros (veja Box, “EREVs e PHEVs: quais as diferenças?”).
Com base em uma análise da McKinsey e em dados de uma pesquisa com compradores de carros dos Estados Unidos e da Europa realizada em outubro/novembro de 2024, este artigo investiga se os EREVs conseguirão atrair mais clientes para a condução elétrica do que os BEVs ou os PHEVs. Também analisa se, num contexto de orçamentos apertados e da iminência de prazos regulatórios cada vez mais rígidos, os OEMs deveriam investir em outras tecnologias de trem de força.
Os EREVs agradam a compradores de carros nos Estados Unidos e na Europa, mas a educação do consumidor é vital
No final de 2024, uma pesquisa da McKinsey com mais de 2.800 compradores de carros novos nos Estados Unidos e 2.300 na Alemanha e no Reino Unido constatou que um segmento considerável de consumidores se dispunha a adquirir um EREV se a opção estivesse disponível. Além disso, dois terços desses compradores em potencial indicaram a intenção de adquirir um veículo híbrido ou MCI na ausência de uma opção EREV. Isso revela que os EREVs são capazes de motivar um número maior de proprietários de veículos com motor de combustão interna a fazer a transição para veículos elétricos (Quadro 1).
Além do preço, o principal motivo que os consumidores entrevistados citaram para preferir veículos MCI a EVs é a chamada “ansiedade de alcance”. Trata-se de uma sensação geral de desconforto relacionada à impossibilidade de dirigir por tanto tempo ou ir tão longe em um EV quanto em um veículo MCI; à inexistência de estações de recarga rápida tão universais ou convenientes quanto os postos de combustível tradicionais; à necessidade de recarregar o veículo com maior frequência; e/ou ao receio de ficar sem energia elétrica antes de alcançar uma estação de recarga.
O interesse por EREVs revelou-se maior entre proprietários de veículos de categoria superior do que entre donos de carros do mercado de massa. Também houve interesse ligeiramente maior por EREVs entre proprietários de carros grandes e SUVs do que entre donos de carros menores.
Um importante segmento de mercado que poderá adotar os EREVs são os proprietários de EVs que estão pensando em voltar a dirigir um MCI devido à frustração com a escassez de pontos de recarga e a autonomia insuficiente de seus veículos atuais. Segundo uma sondagem online realizada pela McKinsey em 2024, por exemplo, 46% dos proprietários de EVs dos Estados Unidos e 19% da Europa indicaram estar pensando em voltar a dirigir um veículo MCI.1
Apesar da aparente atratividade dos EREVs para uma ampla gama de compradores de carros, é vital que haja uma educação do consumidor que comunique claramente os benefícios desses veículos e esclareça as distinções entre todas as opções de EVs e veículos híbridos. Os consumidores têm dificuldades para entender como os EREVs diferem dos PHEVs, BEVs ou outros veículos híbridos – os consumidores americanos parecem achar particularmente desconcertantes as diferenças entre os vários sistemas de transmissão dos EVs e veículos híbridos. Entre os compradores de carros dos EUA incluídos na amostra da pesquisa da McKinsey, quase metade (48%) concordou com a afirmação: “Não consigo dar conta de escolher entre o grande número de sistemas de transmissão (atualmente disponíveis)”.
As ofertas de EREVs no mercado global são escassas, mas estão aumentando
Atualmente, há poucos EREVs no mercado global. Nos Estados Unidos, alguns EREVs no segmento dos SUVs e caminhões foram anunciados para 2025, incluindo o Ramcharger 1500, da Ram Trucks, que teria uma autonomia elétrica pura de 230 quilômetros e autonomia total de 1100 quilômetros. Na China, a Li Auto introduziu vários EREVs, incluindo o L9, com autonomia elétrica de 215 quilômetros e autonomia total de 1310 quilômetros. E o M9, da AITO, proclama uma autonomia elétrica entre 225 e 275 quilômetros e autonomia total entre 1350 e 1400 quilômetros. A Scout Motors, com suporte da Volkswagen, também anunciou vários modelos de EREVs que, segundo a empresa, já receberam um número de reservas consideravelmente maior que o de seus BEVs Terra e Traveler.
Uma autonomia elétrica de 160 a 320 quilômetros atenderia às necessidades de deslocamento diário da maioria dos motoristas, e uma autonomia total de 550 a 950 quilômetros talvez elimine a ansiedade de alcance. E isso pode indicar o sweet spot2 do mercado de EREVs (Quadro 2).
O ambiente regulatório dos Estados Unidos poderá tornar o mercado americano o mais favorável para os EREVs
Os próximos anos talvez tragam oportunidades significativas para a venda de EREVs nos Estados Unidos – e também na União Europeia (embora lá o prazo máximo para que todo veículo novo produza emissões zero seja 2035).
Esse prazo significa que, sob a legislação atual da União Europeia, EREVs só poderão ser vendidos na região até 2034. Os OEMs precisarão avaliar essa estreita janela de oportunidades na UE e seus cronogramas de desenvolvimento para determinar se a demanda do consumidor gerará lucro suficiente para justificar o investimento em trens de força para EREVs. Vale notar que, para as montadoras, trens de força para EREVs talvez sejam uma opção mais segura do que trens para PHEVs, visto que os primeiros agregam à plataforma BEV um pequeno gerador alimentado por um motor de combustão interna que não está conectado ao sistema de transmissão.
Diferentemente da União Europeia, os Estados Unidos não têm uma política instituída de emissões zero para carros novos. No âmbito federal, os padrões da Agência de Proteção Ambiental (EPA) vinculam bônus de conformidade a autonomias elétricas, indicando uma possível vantagem dos EREVs sobre os PHEVs. Por exemplo, um EREV com autonomia de pelo menos 110 quilômetros poderá receber um bônus de 65% em padrões de conformidade, enquanto um PHEV com autonomia de 40 quilômetros tem direito a um bônus de 30%. A regra “Advanced Clean Cars II”, promulgada pelo California Air Resources Board, exige que 100% dos veículos novos vendidos a partir de 2035 sejam elétricos, embora um quinto desses veículos possa ser PHEVs ou EREVs, e os fabricantes podem receber crédito total por cada veículo com autonomia elétrica de pelo menos 110 quilômetros.
Assim, em termos de requisitos regulatórios, as novas oportunidades para EREVs talvez sejam maiores no mercado dos Estados Unidos.
Em termos de custos, os EREVs podem ser uma alternativa competitiva aos BEVs e veículos MCI
Se o foco explícito for alcançar uma autonomia elétrica de 240 quilômetros, o custo total do grupo motopropulsor de um EREV pode ser até $6.000 menor que o de um BEV.3 No entanto, a diferença entre os custos de produção de BEVs e EREVs provavelmente cairá à medida que o preço das baterias diminuir e espera-se que os custos de produção de um EREV fiquem entre os de um BEV os de um MCI de tamanho semelhante. Em um cenário modelado pela McKinsey, uma picape EREV com autonomia elétrica de 240 quilômetros e autonomia total de 800 quilômetros ou mais poderia ser projetada para utilizar um conjunto de baterias de íons de lítio de óxido de níquel-manganês-cobalto de 68 quilowatts-hora (kWh); um BEV comparável precisaria de um conjunto de baterias de 228 kWh para oferecer a mesma autonomia. Nesse cenário, o custo de produção do grupo motopropulsor de um EREV poderia ser 30% a 40% menor que o do trem de força de um BEV (Quadro 3).
Se os OEMs conseguirem reduzir os custos de produção e oferecer EREVs a preço atraentes para compradores que preferem veículos MCI e têm resistência aos BEV, é possível que os EREVs representem uma excelente oportunidade para revitalizar o crescimento das vendas dos EVs. Entretanto, os OEMs devem considerar atentamente a decisão de investir em uma plataforma EREV à luz do aumento da complexidade do seu portfólio. Se um EREV gera uma economia de custos média de $3.000 ao longo do tempo, dois terços dos quais são repassados ao consumidor, o OEM precisará vender no mínimo um milhão de unidades (caso a plataforma EREV custe cerca de $1 bilhão para desenvolver).
Como uma tecnologia-ponte para os consumidores, os EREVs poderão ajudar a suavizar a transição de veículos MCI para BEVs enquanto a infraestrutura de recarga é aprimorada e expandida, e os BEVs vão se tornando mais populares, acessíveis e competitivos no mercado global. Compradores de carros relutantes em adquirir um EV poderão acolher os EREVs como uma opção, desde que os fabricantes consigam tornar a tecnologia acessível e saibam distinguir claramente entre EREVs e PHEVs, veículos híbridos diversos e BEVs, especialmente no mercado dos Estados Unidos. Para os OEMs se beneficiarem da adição da tecnologia motopropulsora EREV, é fundamental não só acelerar o time-to-market, mas também planejar e gerenciar com extrema atenção em vista dos custos adicionais de desenvolvimento e da maior complexidade das cadeias de suprimentos e de produção.