Por Nicola Calicchio e Marcus Frank
O Brasil atravessa uma das piores crises econômicas de sua história e, com isso, temos desafios imensos, em especial no que tange a educação. Se, por um lado, o orçamento não fecha e são precisos ajustes; por outro, a qualidade da educação pública no país é baixa e a necessidade de investimentos na área é premente. Desse modo, a principal pergunta a fazermos é como melhorar a educação pública no Brasil em um ambiente de restrição fiscal?
O primeiro passo é analisar se os atuais gastos do país com a área são adequados. O Brasil investe hoje cerca de 6% do PIB em educação pública, o que, em termos relativos e comparados a outros países, é um percentual significativo. Alemanha, Japão, e Coréia, por exemplo, países que possuem sistemas educacionais públicos de boa qualidade, investem respectivamente menos de 4% do seu PIB. A média da OCDE, grupo que reúne os países com maior nível de desenvolvimento do mundo, é de um pouco menos que 5%.
No entanto, isso não significa que o Brasil invista o suficiente em educação. Como nosso PIB per capita é muito baixo (estamos na 70º posição no mundo), o valor que de fato redunda em investimentos na área também é baixo. Somos um país grande, mas pobre, essa é a verdade. Desse modo, acreditamos que para quebrar o círculo vicioso do baixo desenvolvimento, precisamos, sim, ampliar os gastos públicos em educação.
E há um caminho paralelo para melhorar a educação pública: fazer mais com o que já gastamos, investindo de forma inteligente e eliminando desperdícios. Recentemente, conduzimos um estudo em que comparamos o desempenho de sistemas de educação no mundo todo, medidos por um índice que combina resultados em provas internacionais aplicadas em diferentes idades do ciclo de educação básica, com os gastos por aluno, ajustado para o custo de vida do país. Os resultados são inequívocos.
Primeiro, gastar mais melhora o desempenho em educação, mas, após um certo nível, os ganhos vão se tornando marginais. Ou seja, simplesmente colocar mais dinheiro não resolve. Shangai, por exemplo, que ocupa o primeiro lugar, gasta menos da metade do que os Estados Unidos e tem um desempenho 20% superior. O Brasil gasta 25% a mais que o México e tem desempenho similar. Segundo, dentro de uma mesma faixa de gasto, o desempenho varia muito. A Rússia tem um resultado muito melhor que o Brasil com o mesmo gasto.
Que dá para fazer muito mais com o mesmo, está claro. A questão é o que precisamos fazer. Não temos a pretensão de ter as respostas prontas, mas temos algumas crenças: (1) temos que focar os investimentos nos anos iniciais, garantindo que as nossas crianças aprendam a aprender; (2) os investimentos que geram mais impacto não são focados em infraestrutura ou em tecnologias por vezes caras, mas sim no apoio ao desenvolvimento dos professores e diretores das escolas.
Existem inúmeras evidências de que o investimento em pré-escola é crítico, pois o ser humano desenvolve a maior parte de sua capacidade cognitiva, emocional e social entre zero e seis anos. Investir fortemente na alfabetização e na lógica básica de matemática é fundamental. Se a criança não é bem alfabetizada, como ela vai continuar a aprender à medida que vai crescendo? Parece óbvio que esse deveria ser um preceito básico em qualquer sistema educacional, mas no Brasil isso não é uma verdade absoluta. 34% dos alunos que concluíram o ensino fundamental, ou seja estudaram até a nona série, são considerados analfabetos funcionais. Se olharmos a população como um todo, 27% são considerados analfabetos funcionais, e somente 8% atingem um grau de proficiência adequado.
Se assegurar investimentos nos anos iniciais é importante, outra reflexão relevante é em que tipo de investimento temos maior impacto. Acreditamos que apoiar o desenvolvimento dos nossos professores e líderes escolares é a melhor alternativa. Sem dúvida que assegurar uma infraestrutura básica digna é condição necessária para termos um aprendizado de qualidade. Mas, para darmos um salto na qualidade de ensino, precisamos de professores mais bem preparados, que saibam o conteúdo e a metodologia de como ensinar bem, e líderes escolares com boa capacidade de gestão.
Diversos estudos acadêmicos comprovam essa tese. Um estudo nos Estados Unidos, por exemplo, selecionou estudantes de 8 anos que estavam na média de desempenho e acompanhou a evolução de desempenho deles até os 11 anos. Os que tiveram excelentes professores foram para os top 10%, enquanto os que tiveram professores ruins caíram para a faixa dos 40% piores.
No Brasil, temos diversos exemplos de sucesso dessa estratégia focada em apoiar o professor a ser cada vez melhor. Talvez a iniciativa com maior abrangência foi o programa de intervenção pedagógica que a rede estadual de Minas Gerais massificou a partir de 2007, atingindo mais de 3.600 escolas e 2 milhões de alunos. O estado, que estava em quinto lugar no ranking nacional de desempenho do IDEB para os estudantes do ensino fundamental anos iniciais, saltou para primeiro lugar em 2009, tendo mantido essa posição até 2013. Um estudo da Fundação Lehman em 2013 apontou que 50% das 215 escolas públicas do Brasil que melhor ensinam mesmo em condições socioeconômicas adversas estão no estado.
Acreditamos que esse exemplo demonstra o que podemos alcançar em nível nacional, pois Minas Gerais é um estado com o maior número de municípios do Brasil e que resume bem as nossas diferenças regionais. Além de ser uma iniciativa de grande escala e representativa da realidade brasileira, esse caso também mostra que é possível ter impacto rápido e com investimento reduzido. Apesar de ter atingido esse resultado de destaque em nível nacional, o custo do aluno da rede estadual de Minas Gerais está abaixo da média das redes estaduais no Brasil.
Faria bem ao país aproveitar a oportunidade trazida por uma das piores crises econômicas de sua história e transformar a realidade da educação pública brasileira, promovendo uma gestão escolar que mire a melhoria da qualidade dos professores. Precisamos investir mais em educação pública, mas também precisamos investir melhor.
Nicola Calicchio é presidente da McKinsey para América Latina. Marcus Frank é consultor sênior da McKinsey em São Paulo.