Por Vijay Gosula e João Guillaumon
O Brasil vive há 2 anos um cenário de crise política crônica que não parece perto de arrefecer - situação que dificulta a recuperação da combalida economia do país. Em um mundo em que as taxas de expansão são a diferença entre a sobrevivência ou não de um negócio, o quadro coloca os empresários brasileiros diante de um desafio: como garantir o crescimento mesmo nesse contexto?
Obviamente, esse é um trabalho muito mais simples quando os ventos sopram a favor. Isso não significa, contudo, que a crise condene todas as organizações a resultados pífios. Ao longo de mais de uma década, a McKinsey avaliou as taxas de crescimento de centenas de empresas no mundo. Mais recentemente, verificou se a mudança no cenário global alterou significativamente os fundamentos de expansão traçados antes das turbulências econômicas globais. A resposta foi não.
Para se ter uma ideia, em um período de 30 anos, quase 60% das companhias não-financeiras listadas no S&P 500 foram vendidas. É um mundo de "cresça ou desapareça" - e elas desapareceram. No Brasil isso também é verdade: empresas com alto crescimento, capazes de preservar suas margens nesse processo, têm quase 4 vezes mais chances de superar o Ibovespa do que aquelas com baixo crescimento. Já empresas incapazes de superar o PIB consistentemente ao longo dos anos têm 1,5 vez mais chances de saírem do mercado na década seguinte.
Empresas que crescem atraem investimentos, funcionários talentosos e acumulam mais recursos. Cerca de 75% do crescimento de uma empresa se dão em função dos mercados em que está posicionada sua carteira. Isso pode ser influenciado de várias maneiras, como por meio de aquisições ou da introdução de uma nova linha de produtos. Apenas 25% do crescimento de uma empresa vêm às custas dos concorrentes, com ganho de participação de mercado.
Fazer a escolha correta sobre onde competir requer entendimento detalhado das dinâmicas do mercado. Afinal, as oportunidades não estarão sempre nos locais tradicionais. O papel de cidades entre 150 mil e 10 milhões de habitantes, por exemplo, será cada vez maior: esses municípios representarão dois terços do crescimento do PIB global até 2025. No Brasil, Belo Horizonte e Porto Alegre integram um grupo de 440 cidades emergentes no mundo que serão responsáveis por 47% do crescimento global, de acordo com o McKinsey Global Institute.
Mas nem mesmo a melhor estratégia de 'onde competir' trará resultados, a menos que a empresa mantenha a determinação de colocá-la em prática. Esse é certamente um dos aspectos mais complexos diante de um cenário de crise. Nesse caso, as companhias não têm o benefício de uma maré positiva para gerar dinheiro excedente que permita iniciativas, como se lançar em novos mercados, adquirir empresas ou investir em produtos ou serviços promissores.
As abordagens para buscar crescimento podem ser das mais variadas: uma ampla revisão da estratégia corporativa para o cenário futuro, a análise mais aprofundada de alavancas de resultados em vendas, o foco em construção de novas capacitações específicas e necessárias, a criação de novas unidades de negócio ou práticas de fusão e aquisição.
Muitas vezes as lideranças corporativas se veem em dúvida se a resposta está em expandir para além do "core business" - e a resposta pode ser diferente para cada empresa. Estudo da McKinsey analisou centenas de companhias e verificou que as campeãs de crescimento eram, superficialmente, bem diferentes. Uma análise mais profunda dessas 40 empresas, contudo, revelou características comuns entre elas.
As campeãs de crescimento costumam abordar de forma estruturada a criação e o gerenciamento de suas iniciativas de crescimento, usar "advanced analytics" e técnicas "agile" para identificar novas oportunidades e, por fim, se mobilizam mais rapidamente que os competidores para obter resultados e vencer no mercado.
Muitos podem questionar se o momento é adequado para pensar em crescimento - afinal, entre 2015 e 2016, a economia brasileira encolheu mais de 7%, o que a empurrou de volta a indicadores econômicos de 2010. Mas a capacidade de aproveitar uma crise para sair na frente dos concorrentes é estratégica.
Empresas que foram capazes de realocar seus recursos rapidamente durante as duas últimas grandes crises globais (1999-2002 e 2007-2010) obtiveram retorno aos acionistas quase 2 vezes maior que empresas que fizeram movimentações tímidas e lentas. Realocações devem ser feitas através de grandes movimentos. Investimentos e desinvestimentos (incluindo fusões e aquisições) e busca incessante por melhoria da produtividade e diferenciais de mercado são bons exemplos de ações que aumentam as chances de sucesso ao mesmo tempo em que diminuem as de fracasso.
Com o passar do tempo, empresas se deterioram e o "core" de ontem pode não ser o de hoje ou amanhã. Livrar-se de um negócio decadente é diferente de investir em um com um forte potencial. Mas as duas perspectivas podem estar ligadas através da realocação de escassos recursos financeiros e humanos. As empresas muitas vezes devem se desfazer de negócios que antes eram importantes e focar nos que estão por vir - ainda que seja difícil descartar negócios que cresceram junto com a administração da companhia.
As pressões do mercado de capitais e a dinâmica organizacional podem dificultar que as empresas façam grandes apostas de longo prazo. E, quanto maior você é, mais difícil é crescer. Dito isto, superar a concorrência continua possível em todas as indústrias, mesmo em tempos de economia lenta. Realizar essas movimentações de forma inteligente é, sem dúvida, crucial para virar as chances a seu favor. Mas isso requer disciplina e uma análise implacavelmente detalhada, bem como compromisso com o crescimento que gera valor real e sustentável - o objetivo mais importante de todos. O momento é difícil, mas podemos e devemos agir.
*Vijay Gosula e João Guillaumon são, respectivamente, sócio sênior e sócio da McKinsey.
**Texto originalmente publicado no jornal Valor Econômico